terça-feira, 18 de agosto de 2009

A HISTÓRIA CONTADA COMO ELA ACONTECEU

Carlos Escóssia

O conceituado e lido jornalista Carlos Santos, publica no seu também conceituado e lido blog, uma série de reportagens, como o título "Rosalba Ciarline - Política e Poder", na qual o jornalista relata com muita propriedade e clareza, a ascenção, tropeços e glórias da senadora Rosalba Ciarline no cenário político do Rio Grande do Norte.

No seu relato, Carlos Santos, traça toda a trajetória da atual senadora, apartir do ano de 1988 (portanto há 21 anos atrás) quando a mesma fez sua estreia na política, se candidatando e sendo eleita prefeita de Mossoró.

A séria de reportagens é uma peça jornalística, que com toda certeza, fará parte dos anais político de Mossoró e do estado do RN.

Hoje, este blog transcreve na íntegra: "Rosalba Ciarline - Política e Poder - I e II"

ROSALBA CIARLINE - POLÍTICA E PODER - I


"Laboratório"da Fitema faz nascer Rosalba Ciarline - o mito da "Rosa"


Ao contrário do que seria normal, a trajetória política de Rosalba Ciarlini (DEM) não foi arquitetada pela mente do seu marido, o então deputado estadual Carlos Augusto Rosado (PFL). O emérito articulador político foi voto vencido e relutou em aceitá-la candidata a um cargo eletivo.

O “pai” da “criatura” é outro: jornalista Canindé Queiroz.

Ela é resultado de um ousado e bem-elaborado projeto de campanha que em seguida se alargou à formação de poderoso grupo político, com neologismo derivado do seu prenome: “rosalbismo”. O ponto de partida foi a disputa municipal mossoroense de 1988.

Pesquisa encomendada ao Ibope mostrou a viabilidade de Rosalba, não obstante o largo favoritismo do deputado estadual Laíre Rosado (PMDB). Ele aparecia com 56% de intenções de voto, contra 9% do próprio Carlos e 8% de Rosalba. A rejeição de Carlos Augusto, muito elevada, diferentemente do que ocorria com sua mulher, sinalizava à necessidade de ela ser posta na condição de candidata.

Ex-candidato a prefeito em 1982 e vice-prefeito em 1972, Canindé era o oráculo de Carlos Augusto e amigo muito próximo ao casal. Além disso, tinha a confiança dos ex-governadores Tarcísio Maia (PFL) e José Agripino (PFL), pai e filho – líderes no estado do sistema Maia.

Do alto da Gazeta do Oeste, jornal de referência na mídia regional na época, o jornalista era a voz mais influente de Mossoró.

Preconizou em reuniões com Carlos e outras pessoas próximas, que a vitória seria possível, apesar da fortaleza que Laíre parecia revelar. O adversário imaginava-se imbatível, com apoio do governo estadual (governador Geraldo Melo) e da União (presidente José Sarney-PMDB).

Até então, Rosalba era apenas uma pediatra dedicada às campanhas políticas do marido, sempre em posição secundária, além de mãe zelosa de quatro filhos. Entretanto a hipótese de ir à disputa contra Laíre fez seus olhos brilharem. Carlos, ao contrário, amuou-se. Não queria. Relutava.

A pesquisa para consumo interno – sugerida por Ângelo Fernandes (então superintendente da Rádio Difusora) - e os argumentos de Canindé foram o amolecendo.

Carlos rompera com a liderança do tio e deputado federal Vingt Rosado (sogro de Laíre), anos antes. Aquela era a primeira prova de fogo, num confronto direto com a raiz política do clã Rosado, onde ele fora produzido.

TARCÍISIO MAIA

Carlos sonhava com a disputa e o cargo que pertencera ao seu pai, Dix-sept Rosado, vitorioso em 1948 à prefeitura.

Em alguns momentos de plena liberdade com Canindé, a quem tratava jocosamente por “Miséria”, admitia fraqueza. Entraria na campanha para pelo menos marcar posição, evitando o surgimento de algum aventureiro no vácuo.

O jornalista enxergava por outra ótica. Levou a proposta do nome de Rosalba para Tarcísio Maia. Num primeiro momento, ele também foi contra. Insistia que Carlos deveria ser o candidato. Rosalba era imberbe. Não a via em condições de assumir tamanha responsabilidade.

Canindé não se dobrou e manteve esgrima ainda com o próprio Carlos. Remava contra todos, para gerar em sua piracema a candidatura vencedora.

Para não contrariar o marido, sempre onipotente, Rosalba não emitia opinião própria. Era a cândida “Mãinha”, como ele a trata afetuosamente. Porém virou uma candidata incansável e tenaz. Empolgou.

Atrás de si foi montado um núcleo pensante. Canindé Queiroz, advogado Paulo Linhares, professor Anchieta Alves (presidente do PDT, partido pelo qual ela concorreu), além dos médicos Antônio Gastão e Leodécio Néo. Ocasionalmente, o padre Sátiro Dantas aparecia para dar uns pitacos.

O escritório de Canindé Queiroz, incrustado na Fitema (indústria desativada na Ilha de Santa Luzia) virou o "laboratório", de onde nasceu a “Rosa”, prefixo para popularizar o nome da candidata. Faziam treinamentos para discursos, debates, postura cênica, entonação de voz, uso de indumentária etc. O clichê “irmãos mossoroenses” também vem daí.

Enfim, estava nascendo um mito feito “in vitro”.

A campanha em si foi travada com contínuo crescimento de Rosalba, diante de um marketing meramente festivo do contendor, com trios-elétricos e atrações artísticas. Os discursos foram nacionalizados, em cima de inflação e até – acredite – dívida externa do país.

Laíre (com a aluizista Rose Cantídio-PMDB como vice) caiu na armadilha.

O principal ponto de preocupação era evitar o envolvimento do prefeito Dix-huit Rosado (PMDB) e da prefeitura na peleja, em favor de Laíre. A ardilosidade de Canindé, puxando pela vaidade do governante, o manteve eqüidistante. O prefeito só subiu no palanque da Rosa no dia 4 de outubro.

VERSÃO DE DIX-HUIT

Dix-huit queria fazer o vice-prefeito e empresário Sílvio Mendes prefeito. Vingt (seu irmão) impôs Laíre. Foi o gancho para ser alimentada a cisão entre ambos, enquanto Rosalba marchava ao topo.

Laíre iludiu-se até a decisão do prefeito, à espera do apoio que não chegou. Perdeu tempo e alijou parte do próprio discurso.

Astuto como era, Dix-huit vendeu a versão de que dera a vitória à Rosalba Ciarlini. Uma inverdade.

Carlos Augusto, com uma pesquisa debaixo do braço, visitou-o sem que Canindé soubesse. Era final de setembro. Mostrou-lhe os números em que Rosalba botara vantagem sobre Laíre e avançava à eleição. Foi chamariz para consolidar o êxito, com o prefeito das “milobras” (como gostava de dizer, emendando as palavras mil obras) a apoiando claramente.

As eleições aconteceram no dia 15 de novembro. Rosalba, da coligação “Força do Povo”, contra Laíre da “Aliança Mossoroense” e Chagas Silva da “Frente Popular”, levou a melhor ao lado do seu vice Luiz Pinto (DEM). O resultado das apurações saiu três dias depois. Veja os números abaixo:

- Rosalba Ciarlini - 37.307 (49,7%);
- Laíre Rosado – 30.226 (40,2%);
- Chagas Silva – 2.507 (3.3%);
- Brancos – 3.594 (4.8%);
- Nulos – 1.503 (2%);
- Maioria de Rosalba sobre Laíre Rosado - 7.081 (9,5%).

O eleitorado habilitado ao voto era de 80.397, em 275 secções. Compareceram 75.217 eleitores. As abstenções foram de 5.180 votantes.
Foto – Carlos Augusto, locutor Evaristo Nogueira, Rosalba e Luiz Pinto em agosto de 1988 no bairro Santo Antônio (Acervo do Blog do Carlos Santos).


ROSALBA CIARLINE - POLÍTICA E PODER - II


Arrogância, vaidade e soberba levam Dix-huit a vencer o grupo rosalbista


- A besta não vai voltar!

A frase, acrescida de um sorriso sarcástico, era lugar-comum do então deputado estadual Carlos Augusto Rosado (PFL) em 1992. Fazia alusão ao tio, ex-prefeito Dix-huit Rosado (PDT).

Preconizava entre asseclas que esmagaria de vez o experimentado político, que fora deputado estadual constituinte, prefeito duas vezes (1972 e 1982) e até senador.

Dix-huit apoiara Rosalba Ciarlini em 1988 à prefeitura, mas fora descartado no curso da gestão. Já Carlos teve que engolir em 1990 a candidatura a deputado federal de Mário, filho do ex-prefeito, quando tinha tudo preparado para ser ele o disputante. Era seu sonho acalentado há tempos. Não esqueceu nem digeriu a estocada.

Veio daí o recrudescimento do mal-estar na convivência entre eles.

Dix-huit enfrentaria o vice-prefeito da “Rosa”, empresário Luiz Pinto (PFL), além do professor João Batista Xavier (PCB) como vice. João tinha sido candidato a prefeito em 1982, pelo PMDB, derrotado pelo próprio Dix-huit.

Com mais de 74% em aprovação administrativa, governo que apostava num conceito de gestão baseada em obras de visibilidade e promoção personalista, Rosalba estava também empavonada. Era a prefeita de direito, o marido o gestor de fato. Governavam a quatro mãos.

Era difícil encontrar um correligionário capaz de pensar em resultado diferente: seria um passeio no “Velho”, epíteto repetido pela oposição para dar sentido de maturidade, experiência e biografia a Dix-huit. Falava-se em 20 ou 25 mil de maioria.

Luiz Pinto foi anunciado como candidato no dia 19 de junho. No dia seguinte (20), a convenção partidária sacramentou a postulação. Ele tinha passado meses sendo potencializado na mídia para tal. João Batista seria um meio de dar aura menos conservadora à chapa, que a princípio teria o empresário Manoel Barreto (também do PFL) como ungido a esse espaço.

Pesquisa encomendada por Carlos apontou seu nome. Mas terminou descartado, sob promessa de que adiante ganharia oportunidade de candidatura eletiva. O que nunca ocorreu.

VINGT ROSADO

Na oposição acontecia o que muitos viam como improvável. Dix-huit queria retomar “sua” prefeitura. Mas sabia que o projeto precisava do endosso do irmão Vingt Rosado (PMDB), com quem brigara em 1988, ao apoiar Rosalba. Ainda ecoava em seus tímpanos os berros de Vingt, no rádio e em comícios, o tratando por “traidor” e “safado”.

Aboletado no PDT, que dera legenda a Rosalba em 1988, mas fora vomitado pela prefeita eleita em retorno ao PFL (hoje DEM), Dix-huit insistia com seus interlocutores partidários:

- Só ganhamos com Sandra (a hoje deputada federal Sandra Rosado-PSB, filha de Vingt). Ninguém avalizava a escolha. Era voz isolada.

Argumentava que se Sandra reforçasse sua chapa, Vingt daria o beneplácito. Seria a “isca”, a quebrar o jeito turrão do seu ex-líder. PDT e PMDB unidos.

No dia 22 de fevereiro o peemedebismo proclamou apoio à candidatura de Dix-huit e em 20 de junho a chapa estava homologada em convenção. Tio e sobrinha, que apenas se aturavam, partiam com uma idéia fixa: derrotar Carlos e Rosalba.

No governismo, autoconfiante, Carlos repetia o que dissera pela primeira vez à imprensa, no mês de fevereiro daquele ano: sua chapa não tinha qualquer Rosado. Bastava a “força da Rosa”.

Implicitamente ficava claro que ele, de novo, governaria. Luiz e João entrariam com o nome.

A campanha é recheada de incidentes. Há uma luta paralela na guerra entre emissoras de rádio pertencentes aos grupos envolvidos, além de uma enxurrada de ações no campo judicial.

Nas ruas, o retrato inicial mostra a previsível polarização entre as coligações “Força do Povo” (Luiz Pinto) e o “Vitória do Povo” (Dix-huit). Eclipsa os candidatos Paulo Linhares (PSB) e Luiz Carlos Martins (PT) da “Frente Popular”. Possuem o ex-vereador Herbert Mota (PSB) e o sindicalista Celeste Guimarães como vice, respectivamente. Todos coadjuvantes, apesar da boa biografia de todos.

- Cuidem das campanhas de vocês que a de prefeito está ganha – recomenda Carlos distribuindo dinheiro, em espécie, para vários candidatos a vereador à sua frente, narra um circunstante ouvido pelo Blog.

BENGALA

No alto comando da Vitória do Povo, o moral não parecia elevado. Sem mobilidade, o quase octogenário Dix-huit era substituído no corpo a corpo pela vice Sandra. Em muitos momentos aparecia somente para encerrar uma mobilização.

Em certa ocasião, apoiado numa bengala e sentado numa cadeira, em carroceria de caminhão improvisada como palanque, Dix-huit foi flagrado de longe por Carlos Augusto, no bairro Teimosos. Esse – sem ser notado no interior do veículo - apenas sorriu diante da cena, que parecia confirmar a derrota que previa para o tio.

Na Força do Povo, acontecia algo inverso, mas intrigante. A euforia destinava-se à presença de Rosalba. Os candidatos majoritários às vezes sequer eram notados.

Luiz Pinto terminou a campanha sem conseguir erguer os dedos para formação do “V” da vitória.

Em sua retaguarda, Dix-huit contava com o deputado federal Laíre Rosado (marido de Sandra), professor Anchieta Alves (dirigente do PDT), professor Pedro Almeida Duarte, vereador Pedro Fernandes, engenheiro Valtércio Silveira, além do publicitário Phabiano Santos. Procuravam alterar o cenário desfavorável.

Foram reforçados pelo Instituto Gama (pesquisa) de Wandenberg Pinto e o marqueteiro Aluísio Sobreira, ambos cearenses.

Faltando pouco mais de 30 dias para o fim da campanha, pesquisas internas de lado a lado apontavam números da ordem de 20 a 22 por cento de maioria, em favor de Luiz Pinto. Gradualmente a distância foi diminuindo.

Com cerca de uma semana para o pleito, havia quase empate numérico. Uma das sondagens do Gama dá Dix-huit somente um ponto percentual atrás. Seria prefeito pela terceira vez. Carlos e seus "generais", entre eles de novo o jornalista Canindé Queiroz, estavam diante de uma derrota demolidora.

A presença de Vingt na campanha em palanque (madrugada do dia 27 de setembro); a força do aluizismo assentado no PMDB; a marca de administrador competente do “Velho” e a presença envolvente do ex-governador Geraldo Melo (PSDB) na reta final (22,23 e 24 de setembro) em corpo a corpo fecharam a vitória. Complementaram-na.

Ganhou eco o bordão “Chame o Velho”, além da anticampanha que atribuía a Luiz Pinto o hábito de jogar baralho e a João Batista o ateísmo numa afronta à padroeira Santa Luzia.

Contudo foram a arrogância, soberba e vaidade que entorpeceram Carlos, Rosalba e sua equipe. Formam matriz do ocaso governista. Contaminaram a militância.

Só nos últimos dias perceberam que era tarde para tantos remendos.

Veja abaixo os números finais das eleições de 1992, no dia 3 de outubro:

- Dix-huit Rosado – 37.188 (47.79%);
- Luiz Pinto – 32.795 (42.15%);
- Luiz Carlos Martins – 6.557 (8.43%);
- Paulo Linhares – 1.273 (1.64%);
- Brancos – 5.669 (6.49%);
- Nulos – 3.913 (4.48%);
- Maioria pró-Dix-huit Rosado – 4.393 (5.64%)

O eleitorado cadastrado à época era de 99.623. Compareceram 87.395, as abstenções chegaram a 11.381 e os votos nominais atingiram 77.813.
Foto - Acervo do Blog do Carlos Santos.




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