SINAIS TROCADOS
A
hidrelétrica de Itaipu, no Rio Paraná, que começou a operar em 1984, é
responsável, sozinha, pela geração de 18% da energia consumida
atualmente no Brasil. Vai completar 30 anos com suas turbinas
comemorando mais um recorde de produção, superando pela quarta vez a sua
rival chinesa, Três Gargantas, a maior do mundo em capacidade de
geração, mas cujo ápice de fornecimento foi de 79,5 milhões de
megawatts-hora em 2009. Desde 2008, quando gerou 94,6 milhões de MWh,
Itaipu tem superado a usina do Yang-tsé e fechou 2013 muito próxima dos
100 milhões de MWh. Segundo divulgou o boletim H2Foz Portal das
Cataratas, “precisamente às 15 horas e 38 minutos da segunda-feira 30 de
dezembro de 2013 a geração de Itaipu ultrapassou a impressionante marca
de 98.630.035 Megawatts-hora”.
É reconhecida universalmente
a qualidade da matriz brasileira, na qual Itaipu é apenas uma entre as
dezenas de hidrelétricas que respondem pelo consumo de energia limpa a
70% do mercado doméstico. Suas obras na segunda metade do século passado
retratam a excelência da engenharia brasileira na construção de
barragens, na montagem das usinas geradoras de enorme capacidade e na
difícil instalação de linhas de transmissão para transporte seguro da
energia a grandes distâncias em um território continental. Essa vocação
para as obras de grande porte foi retomada somente na primeira década
deste novo século, com a decisão do governo Lula de vencer a resistência
ao aproveitamento do potencial hidrelétrico dos rios amazônicos. As
três maiores hidrelétricas em construção – Jirau, Santo Antônio e Belo
Monte – vieram afastar a ameaça do grande apagão energético que
fatalmente nos alcançaria já na segunda metade da presente década.
Diante desse quadro promissor, por que se passou a acreditar que será inevitável um racionamento de energia nos
próximos meses, devido à redução do armazenamento de água nos
reservatórios das hidrelétricas do Centro-Sul e Sudeste do País? Quer
dizer que o governo foi imprudente ao dar descontos nas tarifas de
energia, estimulando o consumo num momento em que os níveis de água nos
reservatórios das hidrelétricas estavam abaixo do desejável?
Houve uma combinação
perversa de fatores climáticos, chovendo forte nos lugares errados. O
governo errou ao adiar a correção dos preços da energia, a começar pelo
valor dos combustíveis. Estimulou exageradamente o consumo com o corte
das tarifas, sem considerar o risco climático e o nível modesto dos
reservatórios em um momento que aconselharia transmitir à sociedade a
necessidade de moderação no uso da energia. Isso só se faz com o
consumidor sentindo no bolso o quanto custa gastar mais. Se colocar o
gasto extra no orçamento, não vai obter a redução do consumo de energia
porque ninguém vai fazer a economia que imagina ser dever do outro.
Não é só o governo que precisa ser
racional. O consumidor também precisa ser, mas ele tem de ser avisado da
hora de moderar o seu gasto. O mecanismo para o consumidor tomar
conhecimento do problema é liberar os preços, encontrando mecanismos
para que ele receba os sinais. Quando o governo recorre ao controle de
preços, ele impede o consumidor de ser racional, pois este recebe os
sinais trocados e as coisas não funcionam. É preciso mostrar que a
escassez de água e energia é maior do que aquela que os indivíduos
supõem, para que eles se comportem da forma adequada.
Precisamos,
de fato, reduzir o consumo de energia em 4% ou 5%, para ter uma folga,
para dar aos empresários a garantia efetiva de que não vai haver nenhum
racionamento, que não há o risco de novos apagões e que, portanto, eles
podem prosseguir nos seus investimentos. Ao contrário do que alguns
integrantes no governo imaginam, o sinal de aumentar o preço ajudaria a
sociedade a compreender que estamos num momento excepcional. E que,
quando a normalidade hídrica se restabelecer, as tarifas voltarão também
a um novo equilíbrio. O aumento do preço da energia neste momento,
ainda que aumentasse um pouco a inflação a curto prazo, mostraria que o
governo usa corretamente o sistema de preços como indicador para uso dos
fatores mais escassos, o que ajudará a reduzir a inflação futura.
Fonte: Carta Capital
Por: Delfim Netto
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