UM ESTADO FORTE E EFICIENTE
O orçamento
federal – como todos os orçamentos no Brasil: estadual, municipal, de
empresas estatais, de fundações, de autarquias e até de ONGs, entidades
nominalmente “não governamentais”, mas financiadas pelos governos – tem
caráter geológico. A condição suficiente para um programa estar no
Orçamento de 2015 é que tenha estado no Orçamento de 2014 e, para ter
estado no de 2014, é porque já estava no de 2013... E assim, por uma
indução regressiva, qualquer programa, seguramente sem qualquer
avaliação de sua eficácia, terá permanecido, desde que a “sorte”, isto
é, um jabuti posto na árvore por um político diligente, que ameaçou não
votar o Orçamento na undécima hora se ele não fosse aceito... Ou seja, a
condição necessária é eleger um bom “plantador” de jabutis!
A geologia corre por conta dos
“programas” que se acumulam em camadas. Vão se somando uns sobre os
outros e adquirindo, quando preciso, novos nomes “fantasia”. Por isso é
fundamental, pelo menos a cada geração ou 25 anos, instituir uma
“força-tarefa” para construir o Orçamento de Base Zero: rever e avaliar,
objetivamente, os resultados de todos os programas e ordenar os que
passaram no teste por suas taxas de retorno social.
A Constituição de 1988 escolheu construir
uma sociedade civilizada, onde a igualdade de oportunidades é o “ideal”
a ser perseguido. Isso exige um Estado forte, constitucionalmente
controlado, capaz de regular os mercados e usar eficientemente os
recursos apropriados pelo sistema tributário para proporcionar saúde e
educação para todos (paga por todos) e mitigar os efeitos da transmissão
intergeracional da riqueza acumulada, quer pelo mérito, quer pela
sorte. Há tempo mais do que suficiente para preparar um Orçamento Base-0
(OB-0) e submetê-lo ao escrutínio do Congresso em agosto de 2016, para
vigorar em 2017, destinando 4% ou 5% do PIB para investimento público na
infraestrutura e mantendo o controle da relação Dívida Bruta/PIB.
Isso nos leva a
um segundo grande problema. É inegável que o funcionalismo público de
carreira, admitido por concurso e promovido com a complementação de
cursos de aperfeiçoamento internos, tem melhorado de qualidade. Esta só
não é otimizada por causa da parasitagem dos companheiros de “passeata”
ou de “tertúlias acadêmicas” de livre nomeação que infestam a
administração. Não é possível explicar a ineficiência do Estado
brasileiro sem olhar para a sua estrutura. O recente The Global Competitiveness Report – 2014/2015,
do World Economic Forum, analisa o nível de competitividade de 144
países. Quando separamos o setor privado brasileiro do setor público há
uma enorme perplexidade: somos o 36º (muito melhor que nossos
competidores mais próximos) com relação ao setor privado e,
lamentavelmente, o 136º no setor público (muito pior do que nossos
competidores).
Esses fatos, por mais imprecisos que
sejam e por mais amarga que seja sua digestão, só podem ser explicados
por um grave problema estrutural na organização interna do Estado, cuja
percepção é cada vez mais gritante, como se vê na sugestão de
enfrentá-lo reduzindo o número de ministérios. Isto, por si só, não
eliminaria nenhum dos programas que satisfazem apenas a grupos
organizados e interesses privados disfarçados de públicos, mas não
aumentam a produtividade do trabalhador. A inclusão social deve ser um
instrumento de libertação, não de subjugação do homem ao Estado. O Bolsa
Família com suas condicionalidades e a Agricultura Familiar com
assistência técnica e crédito, são bons exemplos de como programas bem
focados podem criar a cidadania libertadora, sem destruir o equilíbrio
fiscal.
Segundo o Artigo 84, item VI, da
Constituição, a presidenta pode, por decreto, “dispor sobre a
organização e funcionamento da administração federal, quando não
implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”.
Por que, então, não pensar numa segunda força-tarefa composta de
experimentados administradores públicos e privados para colocar o Estado
brasileiro no “estado da arte” e submetê-lo, em 2016, ao Congresso
Nacional como exige o Art. 48, item XI, da Constituição, para analisar
“a criação e extinção de ministérios e órgãos da administração pública”
que eventualmente resultarem do projeto?
Duas iniciativas que mobilizariam a
inteligência nacional e seriam muito bem-vindas para reconquistar a
confiança da sociedade brasileira no Estado, essencial para dar suporte a
ideias e se voltar a pensar o País a longo prazo, sem o que a retomada
do crescimento robusto não acontecerá. Por que não começar do começo em
2017, enquanto pomos em ordem a economia em 2015-2016? O Brasil precisa,
acima de tudo, de esperança!
Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto
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