sábado, 20 de fevereiro de 2010

POR GILBERTO DE SOUSA


O COMUNISTA TUPINIQUIM E O JORNAL CENSURADO

Crispiniano Neto, um dos incentivadores do jornal “subversivo”


Já no final da ditadura militar, pouco antes do processo de anistia política no governo Figueiredo, eu militava no movimento estudantil. Naquele tempo não havia essa ganância dos centros cívicos pelo controle das carteiras estudantis. As lutas eram efervescentes e aguerridas, muito mais observando a contribuição que os estudantes poderiam dar para efetivar as mudanças que a conjuntura acenava para o futuro do país.


A ditadura vinha perdendo sua legitimidade social e sofrendo desgaste político, embora sob ameaça de retrocesso devido à radicalização de setores das Forças Armadas que tentaram barrar o processo de redemocratização. Estávamos no ano de 1979.


A princípio, enveredei pela esquerda porque simplesmente achava bacana ser de esquerda. Depois foi que vieram as noções reais sobre o sonho que acalentava milhões de brasileiros na busca por melhores dias. Aquela briga que se travava contra o poder dominante era idealista e sentíamos que estávamos muito próximos de alcançar os primeiros passos para o objetivo de alternar o regime comando.


O presidente do Grêmio Estudantil do Centro de Educação Integrada Professor Eliseu Viana, a escola Ceipev, do Estado, era Almery Nogueira Júnior, que começara a coordenar o processo sucessório ao lado do seu vice, o Giovani “Paim”.


Almery lançou seu irmão Jorge Everton para presidente e Francisco Nogueira para vice. Um outro grupo que se formava pela oposição formatou uma chapa com Francisco dos Santos da Silva para presidente e me botaram na chapa como vice. No entanto, a chapa era desvinculada e por isso o vice tinha um lugar a mais no processo. Ainda surgiu uma terceira chapa, essa meio elitizada e até parecia que estava ali apenas para não ficar de fora do forjo eleitoral. Era encabeçada por uma mulher, Elysdeire Ferreira de Carvalho. Praticamente não fazia nem campanha.


O jogo começou com uma corrida civilizada onde os candidatos apresentavam suas propostas e faziam os contatos visitando alunos nos três turnos. Santos incluía uma luta a mais, que era o combate ao racismo. Ele não se sentia discriminado e procurava ampliar essa consciência.


Fomos vitoriosos com o estímulo de amigos como David de Medeiros Leite, entre outros. No universo de cerca de 1.200 votantes, Santos obteve em torno de 600 votos e eu 738 votos, exatamente. Botamos a tentativa oligárquica de Almery abaixo.


O mandato era de um ano e a gente tinha pressa para pôr em prática nossas propostas, entre as quais o lançamento de um jornal informativo.


A diretora Socorro Rego e a coordenadora do colégio Alessandra Delfino concordaram com o uso do mimeógrafo da escola para confeccionar o jornal. A intenção era de fazer um jornal convencional de colégio com informações internas. Fomos para a luta, mas precisávamos de orientação e procuramos Aécio Cândido e Crispiniano Neto, que eram estudantes de agronomia na Escola de Agricultura de Mossoró (ESAM), onde também residiam na já famosa casa 14. Eles também eram envolvidos em movimentos populares. Durante os contatos começamos a engolir corda, no bom sentido, de Crispiniano e Aécio e resolvemos publicar alguns artigos direcionados ao enfrentamento da ditadura militar.


Quando o primeiro número do jornal começou a circular, numa noite de quarta-feira, causou o maior rebu por conta dos artigos “subversivos”.


Ainda à noite a diretora nos chamou e pediu que o jornal fosse recolhido e destruído. E assim foi feito. Também só saiu esse número.


Clique aqui e veja outras histórias contadas pelo amigo jornalista Gilberto de Sousa em: "Isso eu vi, isso eu vivi, isso me contaram"

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