LÁ VEM O BRASIL
DESCENDO A LADEIRA
O SUICÍDIO DO BRASIL
Com
a maior urgência o Brasil haveria de implorar por um New Deal para
enfrentar a gigantesca crise em que o meteram. Caso se desse conta da
necessidade, ainda assim faltariam um Roosevelt e um Keynes brasileiros
para executá-lo. Convém admitir, por outro lado, que, nos começos dos
anos 30 do século passado, o presidente americano e seu extraordinário
inspirador britânico, se não careciam de coragem para desafiar a elite
dos Estados Unidos, não se viam, entretanto, às voltas com uma Operação
Lava Jato.
Na entrevista a CartaCapital
publicada na primeira edição deste ano, o ex-presidente da Petrobras
José Sergio Gabrielli, ao afirmar que o Brasil tem de recuperar o
crescimento, entendia como medida essencial investimentos em
infraestrutura. “São portos – dizia Gabrielli –, estradas, ferrovias,
aeroportos e, no caso do petróleo, estaleiros, sondas, plataformas...”
Gabrielli não nos brindava com uma
revelação, e sim com uma constatação. O New Deal significou um enorme
investimento em infraestrutura, em benefício do trabalho e do emprego. É
o que se recomenda neste momento de recessão brava, com óbvia tendência
a se acentuar, mais e mais. Nem por isso, a despeito das evidências,
outras são as receitas sugeridas, ou reclamadas com veemência.
Duas saltam aos olhos, apresentadas como antídotos seguros ao desastre iminente. Uma, a do impeachment
de Dilma Rousseff, como se, uma vez afastada a presidenta, o sol da
ordem e do progresso voltasse a raiar. Trata-se, obviamente, de uma
hipótese não somente golpista, mas também estúpida. Outra, defendida
inclusive por sábios do jornalismo nativo, parece supor que, uma vez
atingidos os corruptos por punições exemplares, o País reencontraria seu
eixo. Nada impede que as duas receitas sejam tidas como complementares.
No primeiro parágrafo deste editorial,
aludia ao Brasil como vítima. De quem? De Dilma? Da corrupção? Do
Partido dos Trabalhadores? Vejamos. Dilma foi reeleita com vantagem de
5% dos votos sobre Aécio Neves. Vitória clara. A corrupção é doença
crônica no País. O PT não cumpriu o que prometia e no poder portou-se
como os demais. Ou seja, aqueles que mantêm a tradição partidária
brasileira, vetusta ao contrário do tempo de vida do PT, nascido depois
da reforma criada pela ditadura em 1979, e capaz, por mais de duas
décadas, de se parecer com um partido de verdade, na melhor acepção
democrática e republicana.
O combate à corrupção
tem todas as justificativas, mas a Operação Lava Jato é apenas o último
(espera-se, se ainda houver espaço para esperanças) ato de um longo
enredo. Juscelino conferiu às empreiteiras um papel determinante, a
ditadura o fortaleceu e ampliou. Desde o primeiro ato, a peça
desenrola-se ao sabor da corrupção. E de muita incompetência até na hora
de roubar. E de prepotência e manobras escusas, e da insuportável
conciliação das elites.
Não são poucos os brasileiros competentes
e honestos. São, porém, minoria absoluta, e não podem fazer a
diferença. Campo livre para a chamada elite, cujo empenho total foi e é
manter de pé a casa-grande e a senzala. Ou, por outra, uma Idade Média
dotada de computadores e celulares de infinitas serventias. A Operação
Lava Jato, ao mirar nas empreiteiras, sem entrar no mérito das razões
que a movem e exigem justas condenações, precipita o impasse paradoxal.
A nossa elite, a turma do privilégio, os
correntistas do HSBC da Suíça e de quem sabe quantos mais paradeiros de
dinheiro lavado e sonegado, é a única, inescapável vilã do entrecho. Sem
empresas adequadas à tarefa, Roosevelt e Keynes não teriam condições de
levar a cabo o New Deal salvador. Aqui, com o processo às nossas
empreiteiras, assistimos ao suicídio imposto ao Brasil por cinco séculos
de predação e três séculos e meio de escravidão.
Apelo ao perdão não é admissível, está claro. Registre-se,
apenas, o desfecho de uma tragédia, que parece até agora não percebida
em toda a sua imponência por quem a provocou e por quem a sofre. E ainda
mais sofrerá, vítima anunciada o tempo inteiro.
Dois episódios desta semana são o
perfeito retrato da sociedade que condena o Brasil ao suicídio. Trata-se
dos moradores da casa-grande e de quantos sonham em chegar lá e já agem
como se fossem inquilinos. O juiz que se apossa do carro do réu. Os
apupos dos frequentadores do Hospital Albert Einstein de São Paulo
dirigidos contra o ex-ministro da Fazenda em visita a um amigo
enfartado.
Exemplos eficazes e aterradores,
reveladores de uma sociedade que ostenta, a par de suas grifes,
ignorância, parvoíce, vocação de trapaça, incapacidade crônica para a
ironia e o senso de humor, prepotência e arrogância sem limites,
hipocrisia e desfaçatez, velhacaria e vulgaridade. São estes os
brasileiros que impõem o suicídio a um país favorecido pela natureza
como nenhum outro.
Ponte: CartaCapital
Por Mino Carta
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