SOLUÇÃO PARA A CRISE É
EXPIAR O ERRO E AVANÇAR
Quando vejo a dificuldade do governo em reconhecer os óbvios exageros
da orientação política que imprimiu à economia por acreditar que isso
diminuiria o que supõe ser a sua autoridade, não posso deixar de lembrar
a expiação pública de um honestíssimo cabeça-dura que conhecia, a priori, todas as respostas certas até para as perguntas erradas, o ilustre presidente Ernesto Geisel.
Em dolorosa mensagem televisiva aos brasileiros, em 1976, quando teve
de anunciar, compungido, a necessidade absoluta de abrir áreas de
exploração do petróleo a empresas privadas por meio de contratos de
risco, confessou: “Entendo os que são contra, porque até agora eu também
fui”. Com a grandeza que todos continuam a reconhecer-lhe, pagou,
naquele instante, diante de toda a nação, o que talvez tenha sido o
maior erro de toda a sua longa, reta e brilhante carreira de aluno de
escola militar ao generalato e, depois, à Presidência da República.
Para entender o drama é preciso lembrar que a crise do petróleo nos
fora antecipada por um grande amigo do Brasil, o então ministro de
Finanças francês Giscard d’Estaing, depois presidente da França. O
presidente Médici convocou uma reunião de ministros para avaliar a
informação e tomar a decisão que dela emergisse. Foi convidado também o
então presidente da Petrobras, general Ernesto Geisel.
Depois de ouvir incomodado e com muito mau humor o que parecia
ferir-lhe a “autoridade”, sentenciou do alto de sua prepotência,
reforçada pelo fato de que já sabia ter sido “escolhido” para suceder a
Médici: “Não devemos fazer nada. Quem aqui entende de petróleo sou eu”.
Fomos todos para casa esperar a crise! Em 1976, quando o futuro já era
passado, reconheceu o erro. Quando a crise nos pegou de “surpresa”, a
produção de petróleo nacional cobria apenas 20% da nossa necessidade!
É hora de encarar os fatos. O sistema capitalista,
com todas as suas injustiças e misérias, foi o único que sobreviveu,
até agora, à seleção histórica e “provou funcionar” no longo prazo, como
mostram os países hoje desenvolvidos, sob o regime democrático. Ele
revelou, desde a sua origem, uma trindade maléfica.
Apesar de proporcionar o aumento da produtividade do trabalho
compatível com a relativa liberdade individual, ele, por si mesmo, é
incapaz de acabar com a pobreza, reduzir as desigualdades e estabilizar o
emprego. Trata-se, entretanto, de uma estrutura social e produtiva com
imensa capacidade de adaptação. Só sobreviveu porque a organização dos
trabalhadores criou o sufrágio universal. Com ele controlou-se o poder
que o capital adquiriu com a sua separação do trabalho criada pelo
reconhecimento da propriedade privada.
A superação dos seus inconvenientes sem jogar fora a liberdade
individual e a eficiência produtiva exige um Estado forte,
constitucionalmente limitado, capaz de regular os “mercados”,
principalmente o financeiro, e garantir o livre funcionamento do
sufrágio universal, impedindo o poder econômico de controlá-lo. Na
“urna”, cada cidadão deve ter, efetivamente, apenas um voto. O
“capitalismo” nem é eterno nem é necessário. É apenas útil!
Estamos presos numa armadilha. Sem a perspectiva de equilíbrio fiscal
num prazo de três a quatro anos, não haverá a confiança necessária para
promover a volta do investimento e, com ele, o crescimento e o emprego.
E sem a volta do crescimento e do emprego, não haverá equilíbrio
fiscal. Presidenta,
reconheça os seus erros. Assuma o seu protagonismo. Leve ao Congresso,
enquanto é tempo, as propostas de reformas constitucionais e
infraconstitucionais que darão funcionalidade à economia brasileira e
convoque, como fez na guerra ao Aedes aegypti, a sociedade para apoiá-las.
É hora de enfrentar a esquerdopatia eleitoral oportunista que esconde o corporativismo do PT.
Ela parasita o seu governo e se opõe às mudanças estruturais. Sem isso
será impossível cooptar a oposição civilizada para ajudar a reconstruir o
desenvolvimento econômico do Brasil.
Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto
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