terça-feira, 31 de maio de 2016

É HORA DE GOVERNAR
O vice-presidente Michel Temer, que teve os mesmos votos válidos da chapa vencedora, assumiu interinamente a Presidência em razão da aceitação do impeachment da pessoalmente íntegra presidenta Dilma Rousseff. Um dos motivos foram as mal-entendidas “pedaladas”. No fundo, elas são o equivalente, no setor privado, ao crime do acionista majoritário do banco que nele toma emprestado! Nesse caso, a pena é a intervenção do Banco Central e um processo criminal, que pode condená-lo à restrição da liberdade.

Na esfera pública, são relações incestuosas entre o Tesouro e suas empresas, taxativamente condenadas pela Constituição. O resto é puro chantilly! É verdade que sempre foram realizadas, mas num nível mínimo aceitável justificado pela complexidade da relação entre os bancos públicos e o Tesouro Nacional. O que causou estranheza foi o abuso, o escandaloso nível alcançado, revelado pelos dados do Banco Central do Brasil.

Para elas chamara a atenção o Tribunal de Contas da União. O erro foi reconhecido, aliás, pelo próprio Executivo, que o sanou a posteriori, de uma só vez, assumindo implicitamente a violação constitucional. É preciso reconhecer que, em condições normais de pressão e temperatura, tal “trapalhada” seria ignorada ou punida com mera advertência.

Os verdadeiros motivos foram o insensato comportamento político de Dilma e o conjunto da sua obra, que elevaram a pressão e a temperatura a níveis sufocantes: 1. Uma queda de 6% do PIB entre o primeiro trimestre de 2015 e o seu homólogo de 2016. 2. Um alarmante aumento do desemprego, que já atinge 11 milhões de trabalhadores. 3. Um desequilíbrio fiscal, que gerou um déficit de 6% do PIB em 2014, 10% em 2015 e ameaça repetir-se em 2016. 4. Uma dinâmica preocupante da relação entre a dívida bruta e o PIB, que pulou de 52% no fim de 2013, para 67% no fim de 2015 e ameaça, se nada for feito, atingir 80% em 2017 e, por último, mas não menos importante.

5. A constituição de passivos contingentes de valores ignorados graças às incertezas introduzidas pela contabilidade “criativa”, a partir de 2012. A derradeira razão do impeachment é um triste fato: os seus votos mostraram que Dilma perdeu as condições necessárias para retomar o seu protagonismo e voltar a administrar o País. Classificar o impeachment como “golpe”, como fazem seus apoiadores, e ela parece crer, não é mais do que narrativa falsa, desesperada, esperta e bem urdida, de se autovitimizarem, visando consequências eleitorais futuras para si e seus partidos. Converte, apenas, os já convertidos! 

E agora, o que fazer? Em primeiro lugar, consolidar a espécie de parlamentarismo duramente construído, repartindo o poder, mas dando-lhe a orientação segura quanto a que o grande problema nacional é restabelecer a confiança da Nação. É preciso reconstruir um caminho viável para voltar a perseguir a sociedade civilizada implícita na Constituição de 1988. A grande missão de Temer é coordenar a aprovação, no Congresso Nacional, de algumas medidas capazes de devolver a esperança de crescimento à economia brasileira, sem o que jamais resolveremos o problema fiscal. É preciso repelir a ideia que se trata de “maldades” que retirarão direitos adquiridos.

No máximo, trata-se de mitigar os efeitos dos parasitas que os ameaçam no médio prazo: 1. Reforma da Previdência: sua insustentabilidade é evidente. Hoje, ela consome o mesmo que países com proporcionalmente três vezes mais idosos do que no Brasil. 2. Vinculações orçamentárias: é ridículo ignorar as mudanças de prioridade das necessidades públicas e fixar gastos em porcentagem da receita.

3. O salário mínimo é um eficiente instrumento de política salarial e distribuição da renda, mas, se usado como indexador do piso previdenciário, introduz distorções que impossibilitam o seu próprio aumento. 4. Liberdade de negociação trabalhista: uma proposta da CUT. Não retira qualquer direito do trabalhador, permite a negociação transparente que acomoda os interesses do trabalhador e do empresário sob controle do sindicato para benefício de todos.
Não são “maldades”. Ao contrário, são “benignidades”! Levarão o Brasil a voltar a crescer, que é a condição necessária, ainda que não suficiente, para a redução das desigualdades e o aumento da coesão social. A condição suficiente virá pela continuação do sufrágio universal, que produz o empoderamento político crescente do cidadão esclarecido.
Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto 
 

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