É HORA DE GOVERNAR
O vice-presidente
Michel Temer, que teve os mesmos votos válidos da chapa vencedora,
assumiu interinamente a Presidência em razão da aceitação do impeachment
da pessoalmente íntegra presidenta Dilma Rousseff. Um dos motivos foram
as mal-entendidas “pedaladas”. No fundo, elas são o equivalente, no
setor privado, ao crime do acionista majoritário do banco que nele toma
emprestado! Nesse caso, a pena é a intervenção do Banco Central e um processo criminal, que pode condená-lo à restrição da liberdade.
Na esfera pública, são relações
incestuosas entre o Tesouro e suas empresas, taxativamente condenadas
pela Constituição. O resto é puro chantilly! É verdade que sempre
foram realizadas, mas num nível mínimo aceitável justificado pela
complexidade da relação entre os bancos públicos e o Tesouro Nacional. O
que causou estranheza foi o abuso, o escandaloso nível alcançado,
revelado pelos dados do Banco Central do Brasil.
Para elas chamara a atenção o Tribunal de Contas da União. O erro foi reconhecido, aliás, pelo próprio Executivo, que o sanou a posteriori,
de uma só vez, assumindo implicitamente a violação constitucional. É
preciso reconhecer que, em condições normais de pressão e temperatura,
tal “trapalhada” seria ignorada ou punida com mera advertência.
Os verdadeiros motivos foram o insensato
comportamento político de Dilma e o conjunto da sua obra, que elevaram a
pressão e a temperatura a níveis sufocantes: 1. Uma queda de 6% do PIB
entre o primeiro trimestre de 2015 e o seu homólogo de 2016. 2. Um
alarmante aumento do desemprego, que já atinge 11 milhões de
trabalhadores. 3. Um desequilíbrio fiscal, que gerou um déficit de 6% do
PIB em 2014, 10% em 2015 e ameaça repetir-se em 2016. 4. Uma dinâmica
preocupante da relação entre a dívida bruta e o PIB, que pulou de 52% no
fim de 2013, para 67% no fim de 2015 e ameaça, se nada for feito,
atingir 80% em 2017 e, por último, mas não menos importante.
5. A constituição de passivos
contingentes de valores ignorados graças às incertezas introduzidas pela
contabilidade “criativa”, a partir de 2012. A derradeira razão do impeachment
é um triste fato: os seus votos mostraram que Dilma perdeu as condições
necessárias para retomar o seu protagonismo e voltar a administrar o
País. Classificar o impeachment como “golpe”, como fazem seus
apoiadores, e ela parece crer, não é mais do que narrativa falsa,
desesperada, esperta e bem urdida, de se autovitimizarem, visando
consequências eleitorais futuras para si e seus partidos. Converte,
apenas, os já convertidos!
E agora, o que fazer? Em primeiro lugar, consolidar a espécie de parlamentarismo
duramente construído, repartindo o poder, mas dando-lhe a orientação
segura quanto a que o grande problema nacional é restabelecer a
confiança da Nação. É preciso reconstruir um caminho viável para voltar a
perseguir a sociedade civilizada implícita na Constituição de 1988. A
grande missão de Temer
é coordenar a aprovação, no Congresso Nacional, de algumas medidas
capazes de devolver a esperança de crescimento à economia brasileira,
sem o que jamais resolveremos o problema fiscal. É preciso repelir a
ideia que se trata de “maldades” que retirarão direitos adquiridos.
No máximo, trata-se de mitigar os efeitos
dos parasitas que os ameaçam no médio prazo: 1. Reforma da Previdência:
sua insustentabilidade é evidente. Hoje, ela consome o mesmo que países
com proporcionalmente três vezes mais idosos do que no Brasil. 2.
Vinculações orçamentárias: é ridículo ignorar as mudanças de prioridade
das necessidades públicas e fixar gastos em porcentagem da receita.
3. O salário mínimo é um eficiente
instrumento de política salarial e distribuição da renda, mas, se usado
como indexador do piso previdenciário, introduz distorções que
impossibilitam o seu próprio aumento. 4. Liberdade de negociação
trabalhista: uma proposta da CUT. Não retira qualquer direito do
trabalhador, permite a negociação transparente que acomoda os interesses
do trabalhador e do empresário sob controle do sindicato para benefício
de todos.
Não são “maldades”. Ao contrário, são
“benignidades”! Levarão o Brasil a voltar a crescer, que é a condição
necessária, ainda que não suficiente, para a redução das desigualdades e
o aumento da coesão social. A condição suficiente virá pela continuação
do sufrágio universal, que produz o empoderamento político crescente do cidadão esclarecido.
Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto
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