DESEMPREGO E INFLAÇÃO
Os economistas costumam respeitar as evidências empíricas
por saberem que elas são a única forma de dar utilidade prática à
disciplina que cultivam, à qual se dá o nome de economia.
Ela tenta entender como se acomoda o comportamento do agente econômico
individual e as consequências de sua inevitável agregação no nível coletivo,
que parecem revelar relações estáveis e, às vezes, mensuráveis. O
grande objetivo é descobri-las e medi-las, nem que seja apenas para
conhecer o sinal do eventual nexo de causalidade. E a grande esperança é
que possam ser manipuladas para melhorar o nível de bem-estar da
sociedade.
Um exemplo interessante desse
processo é a explicação de um fenômeno tão importante quanto a inflação
que acompanha o homem desde o monopólio da emissão da moeda metálica
pelo Estado.
Durante décadas, a manipulação da identidade PT = MV: o
preço médio de tudo que foi transacionado (P), multiplicado pelo volume
unitário das transações (T) é necessariamente igual a tudo o que foi
pago em moeda (M), multiplicado pelo número de transações feito por elas
(V), foi a grande diversão algébrica dos economistas. E levada ao
paroxismo pelos “monetaristas” do século XX, com suas “longas e
variáveis defasagens”. Por causa da instabilidade da relação entre a
massa monetária e o PIB, a política monetária evoluiu para o controle da
taxa de juros de curto prazo.
A evolução foi causada pelas mudanças autônomas dos
comportamentos sociais dos agentes e pelas inovações criadas no mercado
financeiro. Nos meados dos anos 1990, chegou-se à compreensão de que a
política monetária influi na economia por meio de ao menos quatro canais
de “transmissão”: 1. O da taxa de juro.
2. O da taxa de câmbio. 3. O do crédito. 4. O dos efeitos sobre os
preços dos ativos (riqueza). Na ponta da linha dos seus aperfeiçoamentos
estão os modelos dinâmicos estocásticos de equilíbrio geral (DSGE, em
inglês).
O Banco Central do Brasil tem no
seu corpo profissional bem apetrechados economistas e também os seus
modelos. Como ele se comunica com o País em bancocentralês, em
matematiquês e em inglês, é frequentemente mal-entendido. Tem um DSGE de
médio porte que tem sido mantido no “estado da arte”. Recentemente,
recebeu modificações substantivas importantes que, na minha opinião,
sugerem que os seus economistas continuam “ligados” às profundas
incertezas que envolvem a eficácia da política monetária no mundo. Isso é
visível desde o começo, em 2011, quando, provavelmente, com alguma
ironia, eles deram o nome de “Samba” ao modelo mais completo...
É assunto árido, talvez técnico demais, mas muito
revelador. Quais as modificações que foram implementadas? A primeira foi
que “a versão log-linearizada do modelo foi substituída pela
especificação não linear original, que traz como consequência, a
necessidade de definir as curvas de Phillips” (a nebulosa ligação entre
variações de salário e desemprego) e a segunda, que “o bloco fiscal foi
alterado para tratar a tributação como variável de ajuste para atingir o
equilíbrio dinâmico das contas públicas, tornado exógeno o componente
dos gastos do governo”. Não há nada de dramático nos novos resultados,
mas eles mostram uma resposta mais lenta da inflação e mais aguda do PIB
à política monetária.
Suspeito que as incertezas que ainda cercam as decisões do
Fed estão ligadas à perplexidade de Alan Greenspan. Quando, em 2004,
viu a quebra da relação entre as taxas de juro de curto e longo prazo,
chamou-a de enigma (conundrum). As pesquisas empíricas recentes
parecem mostrar um importante declínio do poder da política monetária
para promover a estabilidade da economia. No Brasil é visível pela
segmentação do mercado de crédito. Nos EUA, a elasticidade do emprego
com relação à taxa de juro parece ter se reduzido estruturalmente em
muitos setores, colocando sérios problemas para a sensibilidade da
chamada Curva de Phillips, os mesmos que preocupam os economistas do
nosso Banco Central. No mês de dezembro, talvez saibamos se a chairwoman Yellen decifrou o enigma.
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