UM BOM IMPOSTO
É preciso saudar a renovada disposição da presidente Dilma
de assumir o protagonismo que cabe ao Poder Executivo, sem o qual a
tendência da governabilidade é dissolver-se no ar. Ela tem dado
demonstrações de que introjetou a situação fiscal extremamente
delicada na qual se encontra a economia brasileira. Os seus movimentos,
entretanto, não indicam um objetivo estratégico bem definido,
conscientemente apoiado em movimentos táticos adequados. Por exemplo, o
envio ao Congresso de um projeto orçamentário para 2016 com um déficit primário de 30,5 bilhões de reais,
ao lado de revelar um primarismo político preocupante, negou a
disposição de um olhar de longo prazo para enfrentar o gravíssimo
problema do déficit fiscal “estrutural” em que estamos metidos. A reação
de estupefação da sociedade foi tal que obrigou a presidente a declarar
que “não fugiria à responsabilidade de propor a solução do problema”.
Não será surpresa para ninguém se o governo entregar, em
dezembro de 2016, uma relação dívida bruta/PIB superior a 70% do PIB,
com as suas trágicas implicações. É legítimo, portanto, perguntar se o
projeto original do governo, de estabilizar a relação dívida bruta/PIB, é
ainda prioridade, ou se, voltamos a namorar com a ideia de que o que
nos falta é demanda efetiva.
É hora de deixar de “empurrar com a
barriga” os problemas e terminar o “disse-me-disse” dentro do Executivo e
entre ele e o Legislativo. A solução razoável e sustentável prometida
pela presidenta fugirá, certamente, dos dois extremos: 1. O
cômodo aumento da Receita, que provocaria ainda mais recessão,
transformando-a numa estagnação permanente e prepararia um novo
desequilíbrio. Ou 2. Um insensato corte das despesas que, pela
falta de credibilidade do governo, também aprofundaria a recessão. As
duas, aliás, seriam preliminarmente rejeitadas nas urnas em 2016 e,
definitivamente, em 2018. A solução prática e aceitável talvez seja a
combinação adequada de um aumento condicionado de receita com prazo
limitado, para dar tempo a uma redução inteligente das despesas ao mesmo
tempo em que se melhoraria a eficiência dos serviços públicos.
Hoje parece difícil acreditar, mas foi esse o programa que
Dilma anunciou no primeiro dia do seu primeiro mandato, “Fazer mais com
menos”, e que abandonou depois de 2011. Ela tem razão quando diz que
“não gosta da CPMF, porque ela tem inconvenientes” (veja o artigo da competente especialista Maria Helena Zockun, “A Regressividade da CPMF”, na publicação in Informações Fipe, dezembro de 2007).
É, entretanto, difícil de entender por que ainda não aumentou a
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, a Cide, que tem
fantásticas externalidades positivas como redutora de emissão de CO2 e;
geradora de energia renovável; redutora de importação de gasolina e
ainda capaz de ampliar os investimentos e o emprego. Ela foi,
lamentavelmente, anulada pela política míope de controlar os preços da
gasolina que ajudou a destruir a Petrobras
e todo o setor sucroenergético. O aumento tem sido discutido pela
dinâmica ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Trata-se de um
inteligente imposto ambiental sobre a gasolina, que tem a vantagem de
corrigir na direção correta o consumo de combustível fóssil, uma das
causas do aquecimento global.
O governo precisa tomar conhecimento do
sofisticado e competente estudo preparado pela União da Indústria de
Cana-de-Açúcar sobre o assunto. Um aumento da Cide de 10 para 60
centavos por litro de gasolina vai gerar um aumento da receita do
governo federal da ordem de 15 bilhões de reais, metade do que faltou
para fechar o orçamento, mais 5 bilhões de ICMS estadual, com
arrecadação ainda em 2015. A objeção é que ela provocaria alguma
inflação. Provavelmente, menor do que 0,9% do IPCA, que vai terminar
este ano em torno de 9% a 10%, pela correção dos preços controlados no
passado. Um inconveniente menor diante da solução definitiva dos
dramáticos problemas criados por aquele controle dos preços no setor
sucroenergético. É, evidentemente, melhor absorver o impacto em 2015 do
que empurrá-lo para 2016, onde se espera uma inflação em torno de 5% a
6%.
Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto
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