OS PRINCIPAIS CORREDORES
DA RIQUEZA NO BRASIL
As rodovias Anhanguera e Bandeirantes, que ligam a cidade de São
Paulo a Campinas, no interior paulista, são as grandes artérias por onde
circula a produção de um dos principais corredores econômicos do
Brasil.
Elas ilustram o que os especialistas chamam de eixo de
desenvolvimento: uma área formada por cidades cujas economias progridem e
se reforçam mutuamente, fazendo a região crescer mais rapidamente do
que se cada uma delas tivesse de se virar sozinha.
Nas últimas décadas, diversos corredores de desenvolvimento se
formaram no país — como o do Rio de Janeiro a Campos dos Goytacazes,
estimulado pelo avanço da exploração do petróleo, e os que cortam áreas
industriais tradicionais, como o trecho catarinense de Joinville a
Florianópolis e o território gaúcho de Porto Alegre a Caxias do Sul.
A boa notícia: há novos corredores de riqueza emergindo. Um
levantamento da consultoria Urban Systems mostra os dez principais eixos
econômicos no Brasil e, entre eles, os de desenvolvimento mais recente.
Juntos, eles geram 37% do produto interno bruto, uma parcela 5 pontos
percentuais superior à que tinham em 2007.
Há países em que a criação de corredores econômicos faz parte da
estratégia de desenvolvimento. Há oito anos, a Malásia deu partida a um
plano para aplicar 348 bilhões de dólares na criação de cinco eixos
econômicos até 2030 e, assim, reduzir a dependência da capital, Kuala
Lumpur.
Neste ano, a Índia anunciou que vai investir 30 bilhões de dólares
para reforçar as ligações econômicas entre Mumbai, área financeira e
portuária, e Bangalore, onde existe um polo tecnológico. Em alguns
casos, regiões e países diferentes se unem para planejar em conjunto.
Um exemplo é o eixo formado desde 2000 com a construção de uma ponte
que liga a região metropolitana de Copenhague, na Dinamarca, às cidades
de Malmo, Lund e Helsingborg, na Suécia. Hoje, um terço dos novos
negócios abertos nos dois países aflora no eixo.
“As cidades passam a cooperar quando percebem que, juntas, ganham
mais do que separadas”, diz Hazem Galal, líder global da área de cidades
da consultoria PwC. “As iniciativas de colaboração entre governos de
regiões distintas nem sempre são fáceis.”
No Brasil, os corredores até agora surgiram sem planejamento. As
molas propulsoras são o crescimento das cidades médias e a
desconcentração industrial.
“Muitas empresas passaram a migrar das metrópoles para cidades
menores em busca de custos mais baixos”, diz Thomaz Assumpção,
presidente da Urban Systems. “A preferência é por lugares onde se mantém
a sinergia com o grande centro.” A seguir são destacados quatro dos
mais promissores eixos do Brasil.
1 Eixo Goiânia-Anápolis-Brasília
Outras cidades do eixo: Abadiânia, Alexânia, Anápolis, Brasília,
Goianápolis, Goiânia, Santo Antônio do Descoberto e Teresópolis de Goiás
Desde 2009, mais de 31 000 empresas foram abertas nas oito cidades do
corredor de riqueza formado por Goiânia, Anápolis e Brasília. Outras
70 000 deverão se juntar a elas até 2025, segundo estimativas da Urban
Systems.
É, de longe, o maior polo de atração de novos negócios entre os dez
principais eixos de desenvolvimento brasileiros. Quais são as causas
desse surto de empreendedorismo no Centro-Oeste?
Na prática, esse corredor é uma amostra de como cidades com economias
complementares podem se aproximar para impulsionar o desenvolvimento.
Enquanto Anápolis se consolidou nos últimos anos como um centro
industrial, Goiânia continua atraindo negócios relacionados à vocação
original da região, baseada na produção de carne e de grãos — nela estão
grandes companhias, como a JBS Friboi e a Cargill Agrícola. Brasília,
uma das cidades com maior PIB per capita do Brasil, garante à mistura um
poderoso centro de consumo.
Em boa medida, o surgimento de novas empresas se deve à presença da
capital federal. Brasília irradia estradas que garantem o acesso a
mercados em expansão, como o Norte e o Nordeste, além do próprio
Centro-Oeste. Anápolis também é um entroncamento.
Ali se cruzam duas rodovias e fica o ponto de integração das
ferrovias Norte-Sul e Centro-Atlântica, recém-inaugurado. O aeroporto
local está em fase final de reforma. Mais amplo e moderno, vai se
dedicar principalmente ao transporte de cargas.
A localização no centro do país foi um dos aspectos que atraíram
pioneiros como o empresário Ildefonso Limírio Gonçalves. No fim dos anos
80, ele transferiu de São Paulo para Anápolis a sede do laboratório
farmacêutico Neo Química — há cinco anos, a empresa foi comprada pela
Hypermarcas. O tempo mostrou que ele estava certo.
Com uma boa ajuda de incentivos fiscais do governo goiano, atualmente
há em Anápolis um polo farmacêutico que reúne 39 empresas, como Teuto e
Geolab.
Mais recentemente, a economia se diversificou. Desde 2007, a
montadora Hyundai Caoa investiu 1,8 bilhão de reais em Anápolis. “No
eixo Anápolis-Goiânia-Brasília está se formando uma nova fronteira
industrial”, diz o governador de Goiás, Marconi Perillo.
2 Eixo Ribeirão Preto-Uberlândia
Outras cidades do eixo: Aramina, Buritizal, Delta, Guará, Igarapava,
Ituverava, Jardinópolis, Nuporanga, Orlândia, Ribeirão Preto, Sales
Oliveira, São Joaquim da Barra, Uberaba e Uberlândia
À primeira vista, Ribeirão Preto, no noroeste paulista, e Uberlândia,
no Triângulo Mineiro, parecem ter mais semelhanças do que diferenças
entre si. Ambas têm perto de 650 000 habitantes e suas economias são
quase do mesmo porte, beirando os 19 bilhões de reais por ano.
As duas cidades são as pontas de um eixo de desenvolvimento baseado
mais na competição do que na complementaridade. Não faltam exemplos.
Recentemente, Uberlândia bateu Ribeirão Preto na disputa por uma nova
fábrica de bebidas da Ambev — a unidade está recebendo 550 milhões de
reais em investimentos e deverá começar a produzir até o fim do ano,
gerando em torno de 2 000 empregos.
Ribeirão Preto tenta atrair a chinesa BYD, uma das maiores
fabricantes de veículos elétricos do mundo, que tem planos de investir 3
bilhões de dólares no Brasil e chegou a avaliar a possibilidade de se
instalar em Uberlândia.
“Hoje, Ribeirão Preto e Uberlândia concorrem para atrair
investimentos”, diz o economista Eduardo Nunes Guimarães, da
Universidade Federal de Uberlândia. “E isso tem sido bom para a região.”
O eixo entre Uberlândia e Ribeirão Preto, formado apenas por cidades
do interior, é um caso raro no Brasil — quase sempre, há uma capital
numa das pontas. As duas cidades mostram como a competição resulta num
ambiente de negócios mais favorável para as empresas.
“Um eixo econômico quase sempre começa com as cidades competindo”,
diz Hazem Galal, da PwC. “Com o tempo, isso se transforma em
colaboração, uma vez que, juntas, atraem mais talentos e mais capital.”
Nem sempre houve motivos para concorrência.
Até a década de 70, Uberlândia era uma cidade bem menos atraente — a
economia de Ribeirão Preto, enriquecida após o ciclo do café paulista e,
mais tarde, com a expansão das usinas de açúcar e álcool, tinha o dobro
do tamanho. O cenário começou a mudar com o fortalecimento do interior
do país.
Com isso, Uberlândia assumiu o papel de integrar a indústria paulista
com a expansão do consumo em parte de Goiás, em Mato Grosso e no
interior de Minas Gerais. “Nossa cidade se tornou um elo entre São Paulo
e o interior do país”, diz Walter Faria, presidente do Grupo Martins — a
empresa nasceu em Uberlândia na década de 50 e hoje é o segundo maior
grupo atacadista do Brasil.
Um dos efeitos produzidos pela disputa entre as duas cidades é a
diversificação da economia. O agronegócio já não é a atividade mais
relevante nem em Uberlândia nem em Ribeirão Preto. Com acesso a cinco
rodovias federais, cruzada por um ramal férreo e sede de um entreposto
comercial da Zona Franca de Manaus, Uberlândia se tornou um polo
logístico.
Em Ribeirão Preto, a agropecuária representa hoje, diretamente, menos
de 1% do produto interno bruto da cidade. Mas os serviços relacionados
ao setor movimentam bilhões de reais. A edição deste ano da Agrishow,
feira de tecnologia agrícola realizada na cidade, somou 2,7 bilhões de
reais em negócios — valor 70% maior do que o orçamento da prefeitura
para 2014.
Para dar impulso às empresas inovadoras locais, foi inaugurado
recentemente um parque tecnológico construído pela administração
municipal em parceria com o governo estadual e a Universidade de São
Paulo.
3 Eixo Fortaleza-Mossoró
Outras cidades do eixo: Aquiraz, Aracati, Beberibe, Cascavel, Eusébio, Fortaleza, Fortim, Icapuí, Mossoró, Pindoretama e Tibau
A paisagem à beira das estradas que partem de Mossoró, no Rio Grande
do Norte, em direção ao Ceará é pontuada por centenas de cavalinhos,
como são chamados os equipamentos usados para bombear petróleo do
subsolo. A região é hoje a principal área de extração de óleo em terra
firme no Brasil.
Nas últimas três décadas, a atividade deu os primeiros impulsos à
formação de um eixo de desenvolvimento. Mas foi nos últimos anos que um
corredor de riqueza ganhou força nesse trecho de terras potiguares e
cearenses. Recentemente, aos cavalinhos do petróleo se juntaram os
cataventos dos geradores de energia eólica.
Rio Grande do Norte e Ceará são os estados brasileiros que abrigam mais projetos de produção de energia a partir dos ventos — são os únicos onde a potência instalada já ultrapassou 1 gigawatt. Uma concentração de usinas eólicas está exatamente na divisa entre os dois estados, em municípios como Aracati e Icapuí, do lado cearense, e Areia Branca, no Rio Grande do Norte.
“Os ventos foram um achado para a região, como foi o petróleo 30 anos
atrás”, diz Nicorray de Queiróz Santos, diretor técnico da MS
Renováveis, empresa pertencente ao banco Santander que possui dois
parques eólicos em Areia Branca. Com uma diferença: o petróleo um dia
vai acabar. Os ventos, não.
Além do petróleo e da energia eólica, a região é hoje um florescente
polo agrícola — Mossoró é a sexta maior produtora de frutas do país. A
diversificação da economia estimulou o surgimento de postos de trabalho.
Considerando a lista dos principais corredores do país, o de Fortaleza a
Mossoró é onde deverá surgir o maior número de empregos na próxima
década, de acordo com a Urban Systems.
Embora estejam em estados diferentes, as cidades que compõem o eixo desenvolveram uma relação de muita proximidade nos negócios.
Um exemplo: é pelo porto de Pecém, a 60 quilômetros da capital
cearense, que os fruticultores de Mossoró escoam parte da produção. Mais
de um terço das frutas exportadas por meio de Pecém vem dos pomares do
Rio Grande do Norte.
4 Maceió-Recife-Campina Grande
Outras cidades do eixo: Abreu e Lima, Água Preta, Caaporã, Cabo de
Santo Agostinho, Camaragibe, Campina Grande, Escada, Flexeiras,
Gameleira, Goiana, Gurinhém, Igarassu, Ingá, Ipojuca, Itabaiana,
Itapissuma Paulista, Jaboatão dos Guararapes, Joaquim Gomes, Joaquim
Nabuco, Juripiranga, Maceió, Massaranduba, Matriz de Messias, Mogeiro,
Novo Lino, Palmares, Pedras de Fogo, Pilar, Recife, Riachão do
Bacamarte, Ribeirão, Rio Largo, São José dos Ramos e Xexéu
Muitas vezes, um eixo surge quando as economias das cidades se
aproximam naturalmente, aproveitando vocações complementares. Em outras
situações, é o desenvolvimento da infraestrutura que estimula sua
formação.
Foi o que aconteceu com a construção do porto de Suape, na região
metropolitana de Recife, que originou um corredor que hoje se estende de
Campina Grande, na Paraíba, a Maceió, em Alagoas, passando pela capital
pernambucana.
“O complexo portuário de Suape é o grande motivador do
desenvolvimento dessa região”, diz o economista Alexandre Rands, da
consultoria econômica pernambucana Datamétrica.
Num primeiro momento, as obras no porto levaram à necessidade de
contratar mão de obra e empresas prestadoras de serviços, oriundas em
boa parte dos municípios que ficam no caminho de Recife a Maceió. De
2005 para cá, o perfil mudou para a industrialização.
Atraídas pela facilidade de escoar a produção por Suape, empresas
como Unilever, Campari e Bunge instalaram fábricas na região. Agora o
governo pernambucano impulsiona uma nova área. Ao norte de Recife, na
cidade de Goiana, a Fiat está investindo 7 bilhões de reais, com
incentivos estaduais e federais, numa unidade que deverá começar a
produzir em 2015.
Benefícios também atraíram fabricantes de vidro, como a Vivix, do
grupo pernambucano Cornélio Brennand. Isso está ajudando a expandir a
economia no corredor até Campina Grande, na Paraíba. Localizada a 125
quilômetros de Recife, a cidade serve de centro de qualificação de
pessoal para as empresas do eixo.
Seu polo acadêmico começou a ser formado na década de 50 com a
abertura de cursos de engenharia. Hoje, há em Campina Grande 17
instituições de ensino superior, nas quais 55 000 estudantes se
matriculam a cada ano.
Só a Fiat planeja contratar 500 engenheiros para um Centro de
Pesquisa, Desenvolvimento, Inovação e Engenharia Automotiva que será
instalado em Recife — a empresa dará preferência aos profissionais da
região.
Fonte: Exame
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