ALEMANHA 1X0 ARGENTINA:
O UNIVERSO DENTRO DO MARACANÃ
O último suspiro de uma Copa do Mundo apontada pelo mundo do futebol
como uma das maiores da história. Vitória dos sul-americanos em 1986,
conquista dos europeus em 1990. E o Maracanã abriu suas portas para essa
espécie de melhor de três com 24 anos de atraso. Ao soarem os dois
hinos nacionais, as arquibancadas pulsavam com a beleza de um vinil
repousando pela última vez na vitrola.
Chegaram à final por vias bem distintas. O lugar da Alemanha parecia
guardado desde o começo. Melhor elenco, jogadores com experiência de
Copa do Mundo, craques em quases todos os setores. Oscilou em alguns
momentos, mas nunca perdeu o favoritismo. A Argentina soube aproveitar a
fraqueza dos adversários na fase de grupos, mas não sobrou. E surgiu
nas oitavas como incógnita. A camisa pesou na hora certa e, após a
sofrida vitória contra a Suíça, tudo indicava o Rio de Janeiro como
último destino. O Papa Francisco parecia rogar por eles.
Nenhuma seleção se divertiu tanto nesse Mundial quanto a Alemanha.
Souberam equilibrar privacidade e integração com maestria. E
naturalmente ganharam o apoio popular, mesmo após a surra que deram nos
anfitriões. Se os alemães abraçaram Santa Cruz Cabrália, a torcida
argentina invadiu o Brasil. Na véspera da decisão, não deixaram um grão
de areia descoberto na praia de Copacabana. Fizeram mais: criaram o hit
dessa Copa do Mundo. Los hinchas cantaram “Brasil, decime qué se siente”
nas ruas, estádios, estações de trem e metrô. E evidenciaram que, além
da provocação aos brasileiros, a Copa na Itália também estava entalada
em suas próprias gargantas.
A Argentina não repetia a prudência da semifinal contra a Holanda.
Marcava forte, mas esticava as bolas para um aceso Messi, que causava
vertigem à defesa adversária. O camisa 10 sabe que estava em jogo o
título mais importante de sua carreira. Para muitos, a conquista que o
separa de Maradona. A Alemanha começou nervosa e não conseguia
distribuir os passes no meio de campo que aniquilaram o Brasil em 30
minutos. Trocava a posse por bolas cruzadas aleatoriamente de um lado
para o outro do campo. Se pudesse, trocaria a década de planejamento por
um gol de canela.
E veio a bola mal atrasada por Toni Kroos, candidato à Bola de Ouro
da Fifa, que sobrou nos pés de Higuaín. O argentino teve uma vida para
dominar e finalizar dentro da área, mas falhou. Um erro que os Deuses do
Futebol não toleram. Não se chuta torto por linhas retas em uma final
de Copa do Mundo. Minutos depois, Higuaín enfrentou as divindades,
balançou as redes, mas parou na bandeira corretamente levantada pelo
auxiliar. O medo fez a Alemanha acordar e fechou o primeiro tempo de
forma mais incisiva, metendo uma bola na trave de Romero no último
lance.
O segundo tempo foi todo da cautela, à exceção de um lance em que
Messi surgiu dentro da área fazendo o improvável: perdendo um gol que
Messi não perde. A prorrogação contra os holandeses começava a cobrar o
seu preço. A Argentina marcava agora mais próximo de sua área, sem o
mesmo ímpeto da primeira etapa. O ferrolho estava montado diante de uma
Alemanha que relutava em recuperar sua inspiração. O placar continuava
intacto.
A prorrogação de uma final de Copa do Mundo é o último dia de férias.
Você aproveita ao máximo, mas já com aquela nostalgia. A Alemanha
percebeu que só seria campeã se abdicasse das penalidades. A Argentina
se fechou ainda mais, como um coração machucado após tantos
relacionamentos fracassados. Assim como no duelo contra a Holanda, a
bola procurou Palacio, que novamente tremeu com a possibilidade de fazer
história.
Higuaín, Messi, Palacio. Três gols desperdiçados. Três pecados que
nem Francisco poderia perdoar. Quando tudo indicava que a marca da cal
da pequena área transformaria homens em vilões, o meia Maio Götze, como
um verdadeiro centroavante, dominou uma nação no peito e mandou a
redonda para o fundo de gol de Romero. O Muro de Berlim caía pela
segunda vez.
O tetracampeonato mundial é da Alemanha, que se iguala a Itália e
também fica a um título da supremacia brasileira. Uma rota planejada
desde 2002, logo após o segundo gol de Ronaldo. A derrota servindo como
combustível. Após 24 anos, a Alemanha volta ao lugar máximo do futebol
mundial. E nos despedimos da Copa do Mundo com as cores amarela,
vermelha e preta tremulando. Serão longos quatro anos, mas já não vemos a
hora de 2018 chegar para darmos novamente as boas-vindas ao maior
espetáculo da Terra. Ou melhor, do universo.
Fonte: Esporte Fino - CartaCapital
(Foto: Juan Mabromata / AFP)
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