terça-feira, 12 de abril de 2016

O PODER MODERADOR
O enorme esforço dispendido pelos ministros da área econômica tem sido negligenciado pela tragédia recessiva a que nos levou o intervencionismo voluntarista da política econômica desde 2012.

Assistimos a um desentendimento lamentável entre o Executivo e o Legislativo. Isso tem exigido arbitragens cada vez mais frequentes do Supremo Tribunal Federal, o último “garante” das liberdades individuais e com poder de submeter todos à mesma lei.

A falta de confiança do setor privado no Poder Executivo atingiu o paroxismo e os seus investimentos não param de cair. O mesmo acontece com os investimentos públicos. Sob esse aspecto, é difícil dramatizar, a relação investimento público + privado/PIB no último trimestre de 2015 foi, provavelmente, inferior àquela necessária para manter estável o estoque de capital em torno de 15% do PIB. Estamos em um processo de autofagia, comendo nossas próprias entranhas... 

Há alguma coisa muito errada quando o Executivo não assume o seu protagonismo, o Legislativo inventa sua própria agenda e a judicialização das relações entre eles torna-se “normal”. Isso obriga o STF a transformar-se numa espécie de poder moderador. Rejeitado na Constituinte de 1823, tal Poder foi instituído por dom Pedro I, na Constituição outorgada de 1824, “para que incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos”, o que incluía o Poder Judiciário. O imperador Pedro II exerceu-o até a instauração da República.

Sejamos claros. Um poder superior, o imperador, “velar” pela independência, equilíbrio e harmonia dos Três Poderes é uma coisa. Outra, completamente diferente é, na República, um dos Poderes, qualquer dos três, ter de arbitrar, permanentemente, as diferenças entre os outros dois. Trata-se de um problema político que terá de ser resolvido politicamente. É preciso dar a cada Poder as condições e os meios para cumprir a sua missão. Tanto a judicialização da política quanto a politização da Justiça são inaceitáveis na sociedade “civilizada” que todos desejamos.

Esse é o grave problema que deve ser enfrentado para que o País possa voltar a explorar com inteligência as suas potencialidades. Deveria ser evidente, entretanto, que mesmo bem resolvido, ele não fará desaparecer como por encanto a desintegração estrutural fiscal que a queda do crescimento do PIB pôs em evidência.

Esta é uma questão tão grave e tão complexa quanto a primeira. Teremos de encará-la tão logo o problema do impeachment se resolva, quer com a saída de Dilma, quer com a sua permanência. Por que é uma questão grave e complexa? Porque ouso dizer que nenhum economista profissional que se respeite, não importa a “escola” à qual pertença, sabe responder à pergunta: qual a redução no crescimento do PIB decorrente de um corte de 1% no déficit público? Ela é fundamental para a escolha da melhor saída à desintegração que assistimos nas finanças públicas.

Existem, naturalmente, duas visões extremas, que dependem de muitas hipóteses, de raciocínios duvidosos e de precária sustentação empírica divergente: 1. Neoclássicos e keynesianos tendem a concordar que no curto prazo uma diminuição do déficit público deve produzir uma redução do crescimento do PIB. Só não sabem quanto. 2. Alguns neoclássicos acreditam que se houver confiança no ajuste fiscal, a perspectiva da diminuição do déficit e da sustentabilidade fiscal no longo prazo pode tornar-se positiva, elevando o investimento. 3. Para os neoclássicos, os executores do ajuste fiscal, por motivos políticos, tendem a ser otimistas e a privilegiar o curto prazo, ignorando seus efeitos sobre a acumulação da dívida pública. 4. Na opinião dos neoclássicos, as sugestões dos keynesianos de tentar eliminar os efeitos do ajuste sobre o PIB no curto prazo aumentam a relação dívida/PIB, pressionam a taxa de juros real e tendem a terminar muito mal.

No fundo, os neoclássicos preocupam-se excessivamente com o equilíbrio de longo prazo e os keynesianos tendem a ignorar a sustentabilidade da relação dívida pública/PIB. Nenhum dos dois lados sabe, de fato, o melhor a ser feito. A diferença é entre os que sabem que não sabem e os que não sabem que não sabem. É essa a razão de existirem tantos feiticeiros sugerindo soluções fáceis...

Fonte: CartaCapital
Por Delfim Netto 
 

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