O POVO NÃO É BOBO
Edson Arantes do Nascimento, o
Pelé, fora das quatro linhas onde conquistou, por méritos, o título de
rei do futebol, pisa na bola com frequência. Ainda agora se meteu no escândalo da Fifa e manifestou apoio a Joseph Blatter, presidente renunciatário daquela entidade internacional corroída pela corrupção.
Nem de longe, no entanto, essa foi a pior interferência do
jogador nas questões políticas. Durante a ditadura no Brasil, o Rei
Pelé lançou um édito: “O povo brasileiro não está preparado para votar”.
Pelé fez um golaço. Daquela vez, já fora de campo, um golaço contra.
O eleitor brasileiro, ao contrário do que pensa Pelé, tem
muito mais acertos do que erros, levando em consideração, por exemplo,
as 11 eleições presidenciais diretas ocorridas ao longo dos últimos 70
anos da República. Sobre isso ele nada sabe e, para opinar, deveria
saber. A afirmação de Pelé reflete a posição daqueles observadores
movidos, em geral, pela ignorância ou pelo preconceito.
O povo não é bobo. A mais recente comprovação da correta
percepção popular está nos números de uma pesquisa Ibope, feita em maio,
sobre temas políticos e administrativos. A mídia silenciou sobre o
assunto quando bateu de frente com a resposta dada à seguinte questão
proposta ao entrevistado:
“A imprensa brasileira mostra o País numa situação econômica mais negativa do que a que percebo no meu dia a dia”.
O Ibope admite a influência da mídia “no sentimento de pessimismo dos brasileiros”.
O instituto apoia-se no expressivo número de 41% dos entrevistados que
acreditam nisso. Ou seja, “a imprensa mostra uma situação econômica mais
negativa” do que parece ser.
Existe uma crise econômica inegável e o jornalismo não é
por natureza mensageiro da bem-aventurança. É de Rubem Braga, o grande
cronista, uma afirmação radical sobre isso: felicidade não dá manchete.
Apesar do bombardeio diário contra o governo, muitas vezes
sem comprometimento com os fatos, desponta na resposta da maioria da
população a restrição ao papel da mídia. Ela parece torcer contra e
jogar na posição do quanto pior melhor.
Os entrevistados reconhecem isso. Por
outro lado, andam, porém, mergulhados na descrença sobre o futuro do
País porque vê e sente o desemprego em crescimento e a inflação em alta.
Entretanto, o problema neste caso não está contaminado pelo viés político-ideológico.
A mídia tem o direito de ser conservadora, reacionária ou o
que mais quiser. Só não pode ser desonesta e esconder do leitor um
fato, como o agora relatado, no fundo da gaveta.
Fonte: CartaCapital
Por Mauricio Dias
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