sexta-feira, 28 de junho de 2013

 "SEM REFORMA POLÍTICA NÃO 

HAVERÁ MUDANÇA ALGUMA"


Professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, procurador federal, o ex-deputado Ney Lopes concede uma importante entrevista a ´O JORNAL DE HOJE para falar dos últimos acontecimentos registrados no País, sobre a posição da presidenta Dilma Rousseff nos episódios recentes, principalmente no recuo de convocar uma Constituinte exclusiva para fazer a Reforma Política. Ney fala também sobre a necessidade de uma Reforma Política, justifiando que o atual sistema eleitoral está ultrapassado. Ele comenta também sobre a PEC 37 e diz que Henrique Eduardo “tem agido com equilíbrio e firmeza”. Segue a entrevista:

O JORNAL DE HOJE – Como o senhor analisa os últimos acontecimentos no País?
 
NEY LOPES – O que está acontecendo reflete a insatisfação global com a democracia. Os cidadãos – e não somente os brasileiros – não se sentem representados pelos políticos. O discurso eleitoral perdeu a força, deixou de ser instrumento de persuasão e se transformou em “mentirinha” para a população.

JH – Os protestos de rua podem provocar mudanças de comportamento?
 
NL – As manifestações traduzem, regra geral, reivindicações esparsas e abrangentes da classe política que perde status nos últimos anos. A base da pirâmide social assiste o que acontece e apóia os temas óbvios como, por exemplo, combate à corrupção. A falta de líderes e de uma pauta pré-definida diluem os protestos. Mesmo em tais circunstâncias, não se pode negar que a mobilização já determinou uma conseqüência que foi a declaração de falência da classe política e dos partidos. O Congresso Nacional perdeu a credibilidade por inteiro. Atualmente, qualquer votação sobre tema importante terá a influência do instituto da sobrevivência política com a preocupação de colocar-se bem perante a opinião pública.

JH – Sua opinião sobre a PEC 37?
 
NL – A PEC 37 tinha sólidos argumentos jurídicos pró e a favor. Portanto, o resultado da votação foi normal. A Câmara Federal optou por uma alternativa que não é absurda. Talvez tenham se vacinado para não ser criticados quando se opuserem – como estão se opondo – a possibilidade de convocação do plebiscito e de uma Constituinte para aprovar a Reforma Política. Nesse ponto, a Câmara e Senado não desejam mudar nada em profundidade. Querem fazer “remédios e curativos” para manter o sistema partidário atual, que é uma vergonha nacional e anula qualquer avanço institucional no País. A principal reforma é a política. Sem ela, nada será feito.

JH – No seu entendimento, um plebiscito seria inconstitucional?
 
NL – Não está certo rejeitar a hipótese de convocação do plebiscito para o País decidir o melhor caminho de superar a crise atual. Afinal, plebiscito é ouvir o povo e uma democracia não pode, com base em preciosismos jurídicos, limitar a manifestação da vontade popular. Tal comportamento significa “torcer contra” e ser favorável ao “quanto pior melhor”. No artigo 14, a Constituição Federal prevê o plebiscito. A Lei 9.709/98 regulamenta a convocação e é clara ao permitir a consulta popular em “matéria de acentuada relevância de natureza constitucional, legislativa ou administrativa”.  A Reforma Política tem relevância constitucional e legislativa.  A sugestão presidencial para ser viabilizada dependerá de decreto legislativo proposto pela base política, sendo votado na Câmara e no Senado. Se o Congresso Nacional rejeitar terá que assumir a responsabilidade perante a Nação.

JH – E a desistência da presidenta Dilma não propondo a Constituinte Exclusiva?
 
NL – Todo mundo defendia a Reforma Política. As ruas só falam nisso. O debate foi aberto após a proposta da presidenta Dilma Rousseff. O Congresso Nacional sempre se omitiu sobre esse tema. No início da sessão legislativa os presidentes das duas Casas anunciaram que priorizariam a Reforma Política, mas o destino das reformas foram as gavetas e os arquivos. Quando se falou em plebiscito e a possibilidade de uma Constituinte exclusiva ou derivada as luzes da TV estimularam aqueles que sempre são contra tudo e sugerem alternativas inaplicáveis e teóricas. A presidenta ouviu e recuou. Dobrou-se aos argumentos de que não seria possível mudar a Constituição. Portanto, a “conclusão” que fica é a de que no Brasil, em matéria político/eleitoral a Constituição atende totalmente aos reclamos nacionais e é intocável.  Na prática, significa o “deixa como está, pra ver como é que fica”. De agora por diante, o Congresso irá debater quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?.  Ou seja, se a Reforma Política, Eleitoral e Partidária poderão ser aprovadas sem mexer na Constituição, ou se ela somente será duradoura e estável se a Constituição for alterada.

JH – O Congresso Nacional poderá fazer reforma através de emenda constitucional?
 
NJ -Não fará. Sabe-se disso por antecipação. Vários exemplos existem demonstrando ser impossível mudar sem “mexer” na Constituição. Portanto, Reforma Política sem alteração constitucional é mero engodo. Por exemplo: proibição de coligações nas eleições proporcionais para fortalecer os programas partidários e dá coerência ao processo eleitoral. A norma chegou a ser aprovada e a justiça declarou inconstitucional. A consequência foi a preservação e a intocabilidade do “mercado persa” de venda de legendas em véspera de eleição, que prevalece atualmente. Financiamento público de campanha é outro tema. Somente com ingenuidade ou inexperiência política se poderá afirmar que as mudanças na Constituição seriam feitas através de emendas. O Poder Constituinte derivado. Claro que sim.  Apenas, jamais as emendas que afetem os interesses dos grupos políticos, verdadeiros “proprietários privados” dos partidos, serão acolhidos pelo Congresso. Outros afirmarão: se é assim, também não passariam mudanças numa Constituinte. É diferente. Os eleitos numa Constituinte assumiriam compromissos prévios, existiriam precondições que no atual Congresso não existem. Podia-se adotar a candidatura avulsa para escolha dos constituintes.

JH – Qual a importância de que seja realizada uma Reforma Política?
 
NJ – Sem Reforma Política não haverá mudança alguma. Ela é o alicerce de todas as demais reformas. Como alterar o sistema tributário com a representação popular vinculada a partidos inautênticos e a continuidade da realização de eleições fraudulentas referendadas pelo abuso do Poder Político e Econômico?  Como deixar para depois a Reforma Política e as inadiáveis alterações constitucionais sob a alegação de que há discordâncias entre os partidos? Claro que os partidos discordarão porque a quase unanimidade deles é propriedade privada de grupos, sendo usados para o exercício de manobras eleitorais de véspera de eleição, sem coerência, ética e respeito ao cidadão. Os dirigentes partidários buscam a vitória eleitoral a qualquer custo, mesmo que seja juntado azeite com água.  Nenhuma mudança política será feita se essa realidade não for alterada. Há mais de 20 anos se fala em atualizar e modernizar a legislação eleitoral e nada se faz, salvo transferir para a Justiça Eleitoral a regulamentação das eleições.

JH – Existe outra alternativa para a Reforma Política que não seja o plebiscito e Constituinte?
 
NL – Existe. Entretanto, revelará uma tarefa para estadista. Seria governo e oposição abrindo o diálogo em alto nível (Pacto da Governabilidade) buscando o consenso. As facções escolheriam a melhor alternativa democrática para as mudanças que o País exige. A opção levaria todos a buscarem a governabilidade democrática sem vencidos nem vencedores, através da revisão do “Pacto Social” da Nação. Isso já ocorreu no Chile, Espanha, Portugal e outros Países. Precisa ter visão global e sair da “mesmice” para colocar o Brasil na relação das democracias respeitadas do mundo. Toda mudança constitucional, por exemplo, se consumiria por emendas consensuais sem necessidade de Constituinte. Este é o melhor dos mundos. Sou otimista e ainda acredito que nem tudo está perdido. Recomendo a canção de Raul Seixas: “tenho fé em Deus. Tenho fé na vida. Tente outra vez.

JH – Como o senhor analisa a atuação do presidente da Câmara Federal, deputado Henrique Eduardo, nesse momento difícil da vida brasileira?
 
NL – Henrique confirma que a experiência e vivência são fundamentais para o exercício de cargos públicos de relevância. Tem agido com equilíbrio e firmeza. No Congresso Nacional há muita discriminação contra parlamentares de Estados pequenos que chegam à posições de importância. Henrique Eduardo supera essa dificuldades com muita personalidade. Isso é bom para o conceito do nosso Rio Grande do Norte.

Fonte: Jornal de Hoje
Por: Joaquim Pinheiro

 

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