RETROSPECTIVA: INÉRCIA MARCA
ECONOMIA GLOBAL EM 2012
2012 foi o ano em que notícias
econômicas chocantes perderam o poder de chocar. Nada conseguiu ser
resolvido de fato na economia global: as montanhas de dívidas da Europa e
dos EUA seguiram predominando; comportamentos escandalosos de grandes
bancos ocidentais continuaram ganhando as manchetes; a China fracassou
em tentar equilibrar sua desbalanceada economia.
Com
eleitores americanos indo às urnas e a cúpula da liderança comunista
chinesa sendo renovada, este poderia ter sido um ano de mudanças para as
duas maiores economias globais. Mas a palavra-chave foi continuidade.
O
presidente Barack Obama ganhou um segundo mandato, mas sem o apoio
necessário no Congresso para levar seus planos adiante. E o novo líder
chinês, Xi Jinping, não indicou nenhuma mudança de rumo em suas
prioridades.
Por mais de uma década, economistas
citam preocupações com o enorme excedente comercial chinês. Sua
habilidade de manufaturar quase tudo a preços mais baixos barateou as
compras de consumidores ao redor do mundo. Mas, aparentemente, o país
foi além do que deveria.
Investimentos chineses
Agora,
muitos defendem que é a vez de mais dinheiro entrar no bolso dos
consumidores chineses, permitindo que o crescimento da China seja
sustentado não só nas exportações, mas em um mercado interno.
O
respeitado economista Michael Pettis, da Universidade de Pequim,
adverte que o desequilíbrio econômico atual tornou-se "extremo" e que
reformas são necessárias com urgência. "A China tem investido tanto que
está claro que, pelo menos nos últimos anos, esse investimento tem sido
mal alocado", diz ele, citando aportes em aeroportos no centro do país
que têm baixíssimo movimento. E, apesar disso, novos aeroportos estão
sendo construídos.
Ao mesmo tempo, a China continua a
expandir sua capacidade manufatureira de coisas de que o mundo não
precisa tantas mais, como navios. Sendo assim, por que não investir para
ajudar a tirar milhões de chineses da pobreza, a sair da agricultura de
subsistência ou a trabalhar com mais eficiência - projetos que poderiam
trazer crescimento genuíno?
"O problema é que isso
envolve investimentos de longo prazo, com poucos resultados no curto",
opina Pettis. "Todos concordam que é preciso melhorar a educação nas
áreas rurais pobres, mas os retornos disso levam décadas.
"Ele
sugere que a China aumente a renda de seus cidadãos por meio da
distribuição de terras a camponeses e pela privatização de empresas.
"Mas isso cria um enorme problema, já que toda a estrutura política foi
feita ao redor do controle da economia."
Tudo pelo crescimento
Talvez
seja uma tendência do século 21 o fato de que elites políticas e
eleitores criam expectativas a respeito de uma determinada taxa de
crescimento econômico, e daí o governo faz de tudo para alcançar essa
taxa - enquanto que, no passado, em muitos casos todos teriam
simplesmente sentado e esperado até que o crescimento viesse
naturalmente.
"Sempre surgem problemas quando
você se prende a um sistema que exige aumentos contínuos em
investimentos", prossegue o economista. "Após anos, não é fácil
identificar projetos que sejam economicamente viáveis.
"Ele
cita exemplos disso na Alemanha nos anos 1930, na antiga União
Soviética nos anos 1950 e 60, no Brasil nas décadas de 1960 e 70 e no
Japão nos anos 1980. Todos vivenciaram "milagres de crescimento" e
acabaram se endividando. Pettis acha que a China corre o risco de seguir
o mesmo caminho que o Japão, com excesso de investimentos, crescimento
mais baixo e endividamento crescente.
Questionado
quando a China superará os EUA como maior economia do mundo, ele evita
previsões, mas acha que isso só ocorrerá entre 2030 e 2040, já que os
chineses podem ter chegado a seu pico em termos de taxa de crescimento
anual.
Repetindo a História
A China e os EUA têm
economias e sistemas financeiros profundamente diferentes. Mas, sob
alguns aspectos, as duas economias seguem na mesma direção. Na China, há
bancos sob influência estatal concedendo empréstimos por razões
políticas para manter o crescimento, sem necessariamente retorno
garantido. Nos EUA, bancos apostaram mal e tiveram de ser resgatados
pelo dinheiro dos contribuintes.
"Todos os
sistemas financeiros da história tiveram a tendência de (acumular)
excesso de investimento especulativo, de expandir excessivamente, e daí
de se contrair na forma de uma crise", avalia Pettis.
"Os
últimos três anos só não foram tão ruins quanto poderiam porque a China
respondeu à crise com um aumento extraordinário de investimento,
aumentando sua demanda por minérios e criando investimento adicional em
países como Peru, Austrália e Brasil."Agora, diz ele, estamos presos ao
problema de baixas taxas de crescimento do consumo.
Ao
mesmo tempo, em sua busca por matérias-primas, a China continua a ter
um enorme impacto na África. Agora, porém, com os custos chineses
aumentando, vê o continente africano como um bom lugar para construir
fábricas e produzir mercadorias baratas.
Na Etiópia,
a mão de obra é especialmente barata e preparada. A BBC visitou uma
fábrica em uma área industrial etíope conhecida como Chinatown, onde uma
fábrica chamada Huajian manufatura cerca de 2 mil pares de sapatos por
dia para empresas globais, incluindo Tommy Hilfinger.
Helen
Hai, vice-presidente da fábrica, disse que sua empresa economizou
consideravelmente ao produzir na Etiópia, onde os custos laborais
equivalem a 1/7 dos chineses e a oferta de matéria-prima é boa.
Críticos, no entanto, dizem que os melhores empregos ficam com chineses.
Escândalos bancários
Na
Europa, a crise da dívida não desapareceu, mas o pânico nos mercados
foi acalmado, por conta da crença de que os contribuintes alemães
pagarão, direta ou indiretamente, para salvar os orçamentos falidos do
sul do continente.
O novo chefe do Banco Central
Europeu, Mario Draghi, também teve papel importante em acalmar os
mercados, ao emprestar mais dinheiro a bancos grandes e ao insistir que o
euro é irreversível.
A estrutura do sistema
bancário europeu ficou sob escrutínio maior, à medida que até os poucos
bancos globais que haviam mantido sua reputação foram afetados por novos
escândalos
.O HSBC foi multado por mover dinheiro
para cartéis de drogas. o Standard Chartered admitiu ter descumprido
sanções americanas, e o JP Morgan perdeu US$ 6 bilhões em operações de
risco. O Barclays foi multado após revelações que seus funcionários
manipulavam a taxa Libor, uma das principais referências de juros no
mundo.
Especialistas em sistema financeiro como
Michael Lafferty argumentam que escândalos do tipo evidenciam que foi um
erro permitir que bancos de investimento fundissem suas operações com
bancos comuns.
"Uma grande parte do que eles fazem
não é sistema bancário, é o que antes era chamado de indústria de
títulos financeiros", diz ele. Mas as reformas nesse sistema foram
limitadas, e os bônus dos operadores e banqueiros voltarão a ser pagos
nas próximas semanas
.Nenhum país ocidental chegou a
vetar bancos que combinam movimentação especulativa com ações bancárias
tradicionais, como foi feito com o Ato Glass-Steagall, aprovado nos EUA
quatro anos após o crash financeiro de 1929.
No complexo mundo do
século 21, a inércia parece ser uma força mais potente do que a reforma
radical.
Fonte: Fonte: Portal Terra
Por Martin Webber
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