O TWITTER E A TRANSFORMAÇÃO
DA DEMOCRACIA
A notícia
de que o Twitter deu os primeiros passos para a abertura de seu capital
na Bolsa provocou uma previsível tempestade de especulações sobre o
valor da companhia. Quanto vale de fato uma corporação com 200 milhões
de usuários mensais? Como ela se compara ao Facebook, com seu bilhão de
usuários?
A resposta é: ninguém sabe. Mas isso não importa, porque não é a
questão principal. Embora Twitter e Facebook sejam categorizados como
serviços de rede social, na verdade são tão diferentes quanto a água e o
vinho. E dos dois o Twitter é mais importante em um aspecto: seu
impacto na arena na qual as sociedades discutem as questões políticas.
O que é surpreendente no Twitter é que nos sete anos desde que foi
fundado como um projeto colateral para troca de mensagens entre um grupo
de amigos, tornou-se o verdadeiro difusor de notícias do planeta. E, ao
contrário das agências conhecidas (Reuters, AP, etc), está disponível a
todo mundo, e por isso até os governos às vezes o usam hoje para
divulgar notícias antes que sejam dadas à mídia da corrente dominante.
Mas o Twitter também tem a capacidade de transformar pessoas "comuns"
em "emissoras", um desenvolvimento cujas implicações estamos apenas
começando a digerir. As pessoas desastradas que retuitaram falsas
alegações sobre o lorde McAlpine, por exemplo, não perceberam que
estavam no ramo de teletransmissões. E as tempestades de tuítes de bile e
agressão dirigidas contra as mulheres nos últimos meses levaram a
exigências vociferantes para que a companhia filtre o que passa por seus
servidores.
O que nos leva à política. Um dos aspectos mais notáveis do debate na
Câmara dos Comuns do Reino Unido sobre a Síria foi o modo como muitos
deputados citaram a oposição de seus eleitores à intervenção armada,
enviada por e-mail, como motivo para votar contra a ação proposta.
Nos Estados Unidos, integrantes do Congresso disseram a mesma coisa. É
impossível saber se deputados e congressistas estavam usando a
hostilidade dos eleitores como uma maneira de legitimar suas próprias
opiniões privadas, mas seus protestos deram um novo viés dramático a um
velho enigma: os parlamentares são representantes (legisladores com
mentalidades próprias) ou meros delegados (pessoas que votam como são
instruídas por seus eleitores)?
Edmund Burke levantou a questão em um discurso para os eleitores de
Bristol em 3 de novembro de 1774. "Governo e legislação", disse ele,
"são questões de razão e opinião, e não de inclinação; e que tipo de
razão é essa, em que a determinação precede a discussão; em que um
conjunto de homens delibera e outro decide; e em que os que formam a
conclusão estão talvez a 300 milhas de distância daqueles que ouvem os
argumentos?"
Na época de Burke, quando Bristol ficava a dois dias de viagem de
Londres, a ideia de que os eleitores poderiam determinar os votos de
seus representantes em Westminster em qualquer coisa semelhante ao tempo
real era duvidosa. Por isso a democracia deliberativa era a única opção
disponível.
As recentes racionalizações dos votos pelos deputados britânicos
sugerem que alguns de nossos políticos embarcaram em uma descida
escorregadia. Tecnologias como o Twitter, que oferecem acompanhamento em
tempo real da opinião pública, tornam realizável o pesadelo de Burke. O
que significa que uma empresa capaz de regular as expressões dessa
opinião poderia ser realmente poderosa. E isso deve nos deixar nervosos.
Fonte: CartaCapita
Por John Naughton
Por John Naughton
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