"INCENTIVOS ECONÔMICOS"
PARA AS ELEIÇÕES
Eu só queria pagar as pessoas para lerem.” Eis a forma
singela como Luiza Rodrigues traduz o jeito encontrado por ela para
mudar os rumos da eleição presidencial: testar a convicção alheia com
dinheiro. Insatisfeita com o “controle de preços” do governo, a
economista publicou em seu Facebook uma espécie de promoção. “Minha
contribuição para um Brasil melhor: se você ainda pensa em votar na
Dilma, pago R$ 5 reais (sic) se você ler esse artigo inteiro, me
mandar um resumo de dois parágrafos do texto e me explicar por que você
ainda pretende votar na Dilma.” O artigo sugerido calha de ser uma peça
de pirotecnia econômica para leigos com toques de previsão
milenarista e retórica de botequim assinada pela consultoria Empiricus.
Além de tal dever de casa, era preciso enviar a explicação da decisão, o
número do CPF e os dados bancários. “Se você já não pensa em votar na
Dilma ou mudar de ideia com esse artigo, não vale!”, alertava. “Não se
venda por dinheiro como um corrupto, me deixe gastar R$ 100 (o máximo que gastarei com isso) apenas com pessoas que precisam ser convencidas.”
Direitista pragmática, Luiza queria testar a resistência
argumentativa (e financeira) dos petistas. “Acredito no valor do
incentivo econômico”, diz, a voz séria, de quem realmente acredita no
que diz. “A pessoa pensa: poxa, se alguém está pagando, deve ser
importante.” Todo mundo é avesso a ler algo contrário às suas crenças,
explica. “Eu mesma: sou de direita, nunca leria uma revista de esquerda.
Mas fui ler o programa da Dilma e conheci o Brasil Carinhoso. Achei
fabuloso!” Pausa. “Por isso, assim como estou me forçando a ler sobre o
PT, quem é dilmista deve saber sobre o controle de preços que ela
pratica na marra. Quero ajudar a conscientizar.”
A vocação não é nova.
Luiza passou em revista as promessas dos deputados eleitos no último
pleito, em busca do que foi cumprido. Volta e meia opina nas redes
sociais, com posts como “Moção pelo fim do BNDES, que empresta para o Eike Batista (bolsa milionário) com dinheiro de impostos”. Desta vez, porém, foi mais direta. Leu o texto de Felipe Miranda e teve o peculiar insight.
O autor do artigo “O fim do Brasil”, soa
como uma síntese de Nostradamus, Padre Vieira e Rodrigo Constantino, tão
apocalíptica quanto o que escreve. Seu texto, que promete deixar os
investidores ricos na crise por ele anunciada, alardeia o fim do “nosso
modo de vida” se o governo não mudar (leia-se, se votar em Dilma). Em 12
meses, diz, haverá um “verdadeiro colapso econômico”: “A poupança de
milhões de pessoas será dizimada”, “os destinos de viagens serão
alterados”, assim como “a escola dos filhos pode ser revista”. A
inflação atingirá 15%, haverá “interrupções súbitas de energia e água,
além do aumento de roubos, furtos, arrastões e sequestros”, sem falar em
bloqueio de poupanças e censura da imprensa – ele menciona Goebbels,
Hitler e o nazismo.
Para evitar a catástrofe, bastaria não votar
em Dilma e dar dinheiro para ele. “A verdade é que, quanto menos
pessoas souberem sobre esse investimento, melhor.” Como? “Pois bem… a
assinatura de um ano da série custa apenas R$ 238,80...” e fornece
“acesso a esse conteúdo indispensável àqueles que querem ganhar dinheiro de verdade quando a próxima crise chegar.” A argumentação é tão antiga quanto a Bíblia.
Luiza parece fazer parte de uma espécie
rara no Brasil: a direita que pensa, na esteira da tradição liberal
anglo-saxã. Defende um Estado menor sem apelar para monstros comunistas e
perda de ganhos sociais, enquanto no Brasil restou apenas meia dúzia de
recalcadas vozes raivosas, babando em cima de ativistas, uivando por um
naco maior de lucro privado. “Precisamos de uma direita de coragem e
sem raiva, uma direita inteligente, que não tenha medo de dizer: vamos
privatizar a Petrobrás.” No Brasil ainda se acha que ser de direita é
ser contra os pobres, diz. “Eu não quero maltratar ninguém, só quero
produzir. Por isso nesta eleição devo votar nulo”, explica. “Meu voto é
sempre por mais produtividade e nenhum candidato me convenceu com sua
agenda até agora.”
Experiente para
seus 31 anos, Luiza trabalhou como economista no Santander, foi
consultora no SPC Brasil e lecionou economia na Faap. Por que usar um
texto como o do Empiricus, mais interessado em amealhar um pé de meia do
que em mudar o futuro do País? “Nem acho que seja o melhor texto do
mundo”, explica-se. “Mas o estilo é didático. Facilita para quem não tem
familiaridade com textos econômicos. E as pessoas precisam de uma vez
por todas entender como é errado segurar os preços...” Sem saída para
tanto civismo (e para a fixação com o tal controle de preços), Luiza
acabou optando por Miranda.
Mal postou sua proposta, recebeu mais de
cem mensagens de desconhecidos. “A maioria queria saber se era verdade
que eu ia pagar e queria entender por quê”, conta. Alguns reclamaram do
tamanho e do conteúdo do texto, difícil ou pouco crível. “Outros me
xingaram.” Mas somente três mandaram o resumo – nenhum deles mudou de
opinião. “Essa foi minha surpresa”, diz, frustrada. Luiza não gastou 1
centavo, mas tampouco conseguiu converter alguém.
Com controle de preços ou não, a maioria
dos eleitores parece inclinada a seguir com Dilma, insensível aos
“estímulos econômicos” da direita.
*Reportagem publicada originalmente na edição 812 de CartaCapital com o título "Incentivos Econômicos"
Fonte : CartaCapital
Por Willian Vieira
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